Neabi explica bancas de heteroidentificação para Política de Cotas

Cerca de 1.200 inscrições foram analisadas com taxa de 88% de deferimento para candidatos autodeclarados pretos, pardos, indígenas e quilombolas na primeira chamada do Sisu
Por Jessyka Faustino – jornalista
25/03/2024 14h29 - Atualizado em 25/03/2024 às 14h29
Reitoria da Ufal durante o Copene, Congresso de Pesquisadores Negros do Nordeste

Reitoria da Ufal durante o Copene, Congresso de Pesquisadores Negros do Nordeste

Em parceria com a Comissão Permanente do Vestibular (Copeve) e a Pró-reitoria de Graduação (Prograd), o Núcleo de Estudos Afro-brasileiros e Indígenas (Neabi) da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) analisou, somente na primeira etapa do Sistema de Seleção Unificada (Sisu) deste ano, cerca de 1.187 autodeclarações de candidatos às vagas de cotas para pretos, pardos, indígenas e quilombolas em cursos de graduação da Ufal.

O trabalho durou em torno de 3 dias e resultou na aprovação de 1.056 candidatos, dentre eles 68 quilombolas e 23 indígenas. Para o coordenador do Neabi da Ufal, Danilo Marques, as bancas de heteroidentificação são uma ferramenta importante de efetivação da política de cotas e esse processo tem sido importante para o aumento de estudantes negros, quilombolas e indígenas na Universidade.

“No Brasil, temos uma diversidade na composição étnico-racial, onde a população negra é composta por pessoas pretas, geralmente com cabelo crespo e pele mais escura, e pessoas pardas, com tom de pele mais clara e traços do rosto mais afilados, mas que carregam consigo marcas sociais do fenótipo negro. Nesse sentido, a banca de heteroidentificação analisa se a pessoa autodeclarada preta ou parda é, de fato, sujeito de direito da política de ações afirmativas”, explicou Danilo.

O professor conta ainda que, além da cor da pele, é analisado um conjunto fenotípico que uma pessoa negra possui, como os traços do rosto, por exemplo, e que esse processo é adotado em todas as chamadas do Sisu, de graduação e de pós-graduação, assim como em concursos públicos.

“A banca é composta por três membros e os suplentes, seguindo o critério da diversidade, ou seja, homens, mulheres, pessoas pretas, brancas ou indígenas, assim como docentes, técnicos e estudantes são recrutados para participar das bancas, garantindo o ingresso de estudantes negros, quilombolas e indígenas”, complementou o coordenador do Neabi.

Bancas de heteroidentificação

As bancas de heteroidentificação foram implementadas na Ufal em 2018, sob a supervisão da professora Ligia Ferreira, à época, coordenadora do Neabi da Ufal, a fim de diminuir a possibilidade de fraudes nas vagas reservadas para pessoas pretas nos cursos de graduação e pós-graduação.

A professora Marli Araújo, atual coordenadora do Neabi de Arapiraca, falou sobre a importância das bancas no processo de implementação das políticas de acesso à Universidade, que servem para legitimar e reconhecer uma luta histórica das pessoas negras. “Não estamos falando apenas de um reconhecimento de fenótipo, mas o reconhecimento em um processo de luta histórico pela inserção de pessoas negras nos direitos às políticas sociais brasileiras. Ao fazê-las, nós estamos dizendo ao Estado brasileiro que a sua população negra existe e que sua existência é negada enquanto acesso aos direitos sociais.” destacou Marli.

Histórico do sistema de cotas na Ufal

Desde 2003, a Ufal adere ao sistema de política de cotas para estudantes negros através do Programa de Ações afirmativas (Paaf), implementando pelo professor Moisés Santana, na época coordenador do então Núcleo de Estudos Afro-brasileiros (NEAB), visando ingresso e permanência das pessoas contempladas pelo Paaf.

Naquele momento, a Universidade tornou-se uma das primeiras do país a destinar 20% das vagas para a política de cotas. Nove anos depois, em 2012, institui-se a lei n° 12.711, que destina 50% das vagas para estudantes negros ou de escola pública. Inicialmente, as vagas eram destinadas 60% para mulheres e 40% para homens.

Além de pessoas pretas, atualmente as vagas destinadas às cotas abrangem quilombolas, indígenas, pessoas com deficiência (PCDs) e pessoas em situação de vulnerabilidade social. A estudante Ana Miranda, do curso de História, é fruto da implementação da Lei de Cotas na Universidade e dá dicas valiosas para quem for passar por uma banca de heteroidentificação futuramente.

“Tudo que construímos enquanto pessoas pretas é coletivo, por isso, reconhecer a importância das bancas de heteroidentificação é primordial. A branquitude sempre vai tentar descaracterizar e desfazer os mecanismos que criamos para contornar a sociedade estruturalmente racista em que vivemos. Por essa razão, é importante ler com atenção o edital para não cometer alguns erros como, por exemplo, ir maquiada ou com o cabelo sem estar natural, para não ser indeferido”, relatou a estudante.

As bancas continuaram a acontecer nas demais chamadas do Sisu. Para acessar o edital ou verificar as chamadas, acesse o site da Copeve.