Mais de um bilhão de pessoas vivem com obesidade, revela pesquisa

O estudo com participação de pesquisadores da Ufal, analisou dados de três décadas e mostra diminuição do número de pessoas com baixo peso e aumento da prevalência da obesidade na maioria dos 190 países avaliados
Por Manuella Soares - jornalista
07/03/2024 14h23 - Atualizado em 07/03/2024 às 15h52
Em 2022, as taxas de obesidade foram maiores para meninas e meninos

Em 2022, as taxas de obesidade foram maiores para meninas e meninos

Pesquisadores da Ufal, liderados pelo professor Haroldo Ferreira, da Faculdade de Nutrição da Universidade Federal de Alagoas (Fanut/Ufal), contribuíram para um estudo internacional que buscou entender como a obesidade e o baixo peso mudaram em todo o mundo no período de 1990 a 2022. O resultado do trabalho foi recém-publicado na revista científica The Lancet, uma das mais prestigiadas do mundo na área médica.

Os dados são de autoria do NCD Risk Factor Collaboration (NCD-RisC), um grupo de pesquisa multicêntrico do qual fazem parte o professor Haroldo e sua aluna de pós-doutorado Tamara Rodrigues, em colaboração com a Organização Mundial da Saúde (OMS).

Os pesquisadores analisaram medidas de peso e altura de mais de 220 milhões de pessoas que foram subdivididas em dois grupos: de cinco a 19 anos (63 milhões) e de 20 anos ou mais (158 milhões), representando mais de 190 países. Para ter o resultado esperado em dimensões mundiais, o trabalho contou com a participação de 1,5 mil pesquisadores disponibilizando e analisando os dados de Índice de Massa Corporal (IMC) desses indivíduos.

De acordo com o estudo, o número total de crianças, adolescentes e adultos em todo o mundo vivendo com obesidade ultrapassou a cifra de um bilhão. “Essas tendências, juntamente com a diminuição da prevalência de pessoas com baixo peso desde 1990, tornam a obesidade a forma mais comum de má nutrição na maioria dos países”, explicou o professor Haroldo.

A análise de dados globais estima que entre as crianças e adolescentes, a taxa de obesidade em 2022 foi quatro vezes maior do que em 1990. Entre os adultos, a taxa de obesidade mais do que dobrou em mulheres e quase triplicou em homens. No total, 159 milhões de crianças e adolescentes e 879 milhões de adultos estavam com obesidade em 2022.

No contraponto a esses números, a proporção de crianças e adolescentes afetados pelo baixo peso, um indicador de desnutrição, diminuiu cerca de um quinto em meninas e mais de um terço em meninos. Já a proporção de adultos afetados por baixo peso apresentou redução de cerca de 50% no mesmo período analisado.

“Obesidade e desnutrição são formas de má nutrição e são prejudiciais à saúde das pessoas de várias maneiras. Esse estudo fornece um quadro altamente detalhado das tendências globais de ambas as formas de má nutrição ao longo dos últimos 32 anos”, destaca Haroldo.

Os autores também ressaltam que “é muito preocupante que a epidemia de obesidade que era evidente entre adultos em grande parte do mundo em 1990, agora seja refletida em crianças em idade escolar e adolescentes. Ao mesmo tempo, centenas de milhões ainda são afetados pela desnutrição, especialmente em algumas das partes mais pobres do mundo. Para combater com sucesso ambas as formas de má nutrição, é fundamental melhorarmos, de forma ampla, sistemática e permanente, a disponibilidade e o acesso de todas as pessoas a uma alimentação adequada e saudável”.

Preocupação desde a infância

O artigo revela índices preocupantes em relação à faixa etária entre cinco e 19 anos. Segundo os dados, as taxas globais de obesidade mais do que quadruplicaram em meninas (1,7% para 6,9%) e meninos (2,1% para 9,3%), com aumentos observados em quase todos os países.

Já a proporção de meninas com baixo peso caiu de 10,3% em 1990 para 8,2% em 2022, e para meninos, caiu de 16,7% para 10,8%. Entre meninas, uma diminuição nas taxas de baixo peso foi detectada em 44 países, enquanto entre meninos, uma diminuição foi observada em 80 países. O Brasil aparece nas duas situações.

O número total de crianças e adolescentes afetados pela obesidade em 2022 foi de quase 160 milhões (65 milhões de meninas e 94 milhões de meninos), em comparação com 31 milhões no primeiro ano de recorte temporal do estudo. Em relação ao baixo peso, a curva é decrescente. Em 2022, 77 milhões de meninas e 108 milhões de meninos se enquadraram nesse índice, o que significa dizer que foram 4 milhões de meninas e 30 milhões de meninos a menos em relação a 1990.

Adultos com quatro vezes mais obesidade

A pesquisa alerta para o alto índice de obesidade na população adulta. Os dados apresentados estimam que quase 880 milhões de adultos estavam vivendo com obesidade em 2022, sendo o problema particularmente mais frequente entre as mulheres (504 milhões). Esses números são quatro vezes e meia os 195 milhões registrados em 1990, quando havia 128 milhões de mulheres e 67 milhões de homens obesos.

Isso significa que em 32 anos houve um aumento de 294% no número de mulheres enfrentando a obesidade. Considerando o crescimento populacional global, as taxas de obesidade mais do que dobraram entre as mulheres (8,8% para 18,5%) e quase triplicaram para os homens (4,8% para 14,0%) entre 1990 e 2022. A proporção de adultos com baixo peso foi reduzida à metade entre 1990 e 2022 (14,5% para 7,0% em mulheres; 13,7% para 6,2% em homens).

Os números da população adulta, a partir de 20 anos, combinados com os 159 milhões de crianças totaliza mais de um bilhão de pessoas afetadas pela doença no último ano de análise da pesquisa. Já em relação ao baixo peso são 183 milhões de mulheres e 164 milhões de homens afetados em 2022, o que significa 45 milhões e 48 milhões a menos, respectivamente, do que em 1990.

Tendência e alertas

A análise dos dados revela um processo de transição na maioria dos países, em que mais pessoas passam a ser afetadas pela obesidade e menos pelo baixo peso. Em 2022, as taxas de obesidade foram maiores para meninas e meninos em cerca de dois terços dos países, sendo 133 países com mais meninas obesas e 125 países onde os meninos lideraram.

Ainda segundo a pesquisa, a carga combinada de ambas as formas de má nutrição aumentou na maioria dos países em todos os grupos etários, durante todo o período analisado, impulsionada pelo aumento das taxas de obesidade. “No entanto, a dupla carga de má nutrição diminuiu em muitos países do Sul e Sudeste da Ásia e em alguns países da África para homens, onde a taxa de baixo peso diminuiu acentuadamente”, frisou Haroldo.

O diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, se pronunciou sobre os resultados destacando a importância deste novo estudo para a prevenção e o gerenciamento da obesidade desde a infância até a idade adulta, por meio de alimentação saudável, atividade física e cuidados adequados: "Voltar ao caminho certo para alcançar as metas globais de combate à obesidade exigirá o trabalho de governos e comunidades, apoiado por políticas baseadas em evidências divulgadas pela OMS e agências nacionais de saúde pública. É importante ressaltar que isso requer a cooperação do setor privado, que deve ser responsabilizado pelos impactos na saúde causados por seus produtos".

Os autores alertam que questões globais importantes aumentam o risco para ambas as formas de má nutrição: "O impacto de questões como mudanças climáticas, interrupções causadas pela pandemia da covid-19 e a guerra entre países exacerbam o risco de piorar tanto as taxas de obesidade quanto as de baixo peso, aumentando a pobreza e o custo de alimentos. Os efeitos disso são alimentos insuficientes em alguns países (afetando o âmbito familiar) e mudanças para alimentos menos saudáveis em outros. Para criar um mundo mais saudável, precisamos de políticas abrangentes para enfrentar esses desafios".

O artigo completo está disponível no site do The Lancet.