Pequenos mamíferos da Caatinga sofrerão pelas mudanças climáticas

Estudo liderado por bióloga do Museu de História Natural da Ufal revela dados alarmantes sobre preservação das espécies
Por Maria Villanova, estudante de Jornalismo e assessora do Lacos 21
04/03/2024 16h40 - Atualizado em 06/03/2024 às 14h14
80% das espécies de pequenos mamíferos da Caatinga devem perder áreas climaticamente adequadas até 2070

80% das espécies de pequenos mamíferos da Caatinga devem perder áreas climaticamente adequadas até 2070

Um estudo liderado pela doutoranda Anna Ludmilla Costa Pinto, pesquisadora no Museu de História Natural da Universidade Federal de Alagoas (MHN/Ufal) e membro do Laboratório de Conservação do Século XXI (Lacos 21), traz um alerta sobre o impacto das mudanças climáticas sobre os pequenos mamíferos na Caatinga, bioma semiárido tipicamente brasileiro. O resultado, divulgado em fevereiro deste ano, aponta que mais de 80% das espécies de pequenos mamíferos na região devem perder áreas climaticamente adequadas até 2070.

A pesquisa, fruto de três anos de estudos e observação, faz parte do projeto de doutorado da bióloga e utilizou a Modelagem de Nicho Ecológico para projetar os efeitos das mudanças climáticas em 24 espécies de pequenos mamíferos na Caatinga até os anos de 2050 e 2070. Os resultados indicam uma diminuição significativa das áreas adequadas para a sobrevivência dessas espécies, com algumas delas enfrentando perdas de até 90% de sua área climaticamente favorável. Inclusive, o estudo aponta que já há espécie vivendo no limite climático.

“A vulnerabilidade da Caatinga, por ser um bioma naturalmente semiárido e que sofre muitos impactos da atividade humana, torna-se mais evidente com as mudanças climáticas extremas e processos de desertificação. Nesse contexto, é de fundamental importância estudos que buscam entender a compreensão da distribuição atual e futura da diversidade de mamíferos na região. Identificar áreas estáveis que possam servir como habitats viáveis para essas espécies é essencial para sua sobrevivência a longo prazo”, explica a professora. 

Ocupando mais de 10% do território nacional, e estando presente nos estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Sergipe, Alagoas, Bahia, Piauí e Minas Gerais, a Caatinga não recebeu status de patrimônio nacional pela Constituição Federal, mesmo sendo o único bioma 100% brasileiro. Estudos como o de Ludmilla são de extrema importância para chamar a atenção por políticas públicas destinadas à sua conservação e preservação de sua fauna e flora diante das mudanças climáticas.

Os impactos negativos serão maiores em espécies com ocorrência mais restrita dentro da Caatinga ou ainda espécies endêmicas, adaptadas a nichos específicos e já enfrentando pressões devido à fragmentação do habitat e atividades humanas. A perda de área climaticamente adequada pode levar a uma redução drástica de suas populações, aumentando significativamente o risco de extinção. Portanto, a conservação dessas espécies torna-se ainda mais urgente, demandando estratégias específicas e eficazes de manejo e proteção de seus habitats na Caatinga.

Co-orientador da tese, o professor Ricardo Bovendorp, ecólogo e professor visitante da Universidade Estadual de Santa Cruz (Uesc), destaca a importância do estudo, salientando que a Caatinga é o bioma com menor número de estudos sobre biodiversidade entre os biomas brasileiros. Ele ressalta que a pesquisa da bióloga é pioneira, fornecendo um panorama sobre a distribuição das espécies de pequenos mamíferos na Caatinga e como elas serão afetadas pelas mudanças climáticas.

O que se vê, portanto, é uma grande contribuição não só para um olhar mais atencioso à fauna da Caatinga, mas também para a Academia como um todo. “Temos uma lacuna muito grande de pesquisadores e professores na área mamíferos, sobretudo nacionais, e a Ludmilla vem para somar sua expertise no trabalho realizado no Museu de História Natural com a formação e especialização, sendo um excelente ganho para a sociedade, para a Ufal e para a preservação das espécies”, ressalta a ecóloga e professora Ana Malhado.

A pesquisa da bióloga Ludmilla traz importantes apontamentos sobre os impactos iminentes das mudanças climáticas na biodiversidade da Caatinga, destacando também a urgência de políticas públicas voltadas para a conservação desse bioma único e integralmente brasileiro. Com resultados tão contundentes, espera-se o estímulo de ações de reconhecimento do impacto das mudanças climáticas, sobretudo para os pequenos mamíferos, e a proteção efetiva da Caatinga.

Para visualizar a pesquisa, acesse o link.