Pesquisadora inicia estudos aos 9 anos e hoje é mestre pela Ufal

Conheça a história da jovem que apostou todas as fichas na educação

30/12/2015 13h51 - Atualizado em 06/01/2016 às 19h32
Márcia Ferreira fez da educação o norte para sua vida pessoal e profissional

Márcia Ferreira fez da educação o norte para sua vida pessoal e profissional

Myllena Diniz – estudante de Jornalismo

Exemplo de superação, Márcia Ferreira revirou o destino pelo avesso e encontrou na educação o norte para a sua trajetória pessoal e profissional. Desde o primeiro dia em que colocou os pés numa sala de aula, aos 9 anos de idade, a alagoana coleciona sonhos que a levaram ao mestrado em Diversidade Biológica e Conservação dos Trópicos, na Universidade Federal de Alagoas.

A paixão pelos livros acompanhou a garota, natural de Craíbas, município do Agreste de Alagoas, até seu ingresso na Universidade, em 2007. Logo, o encantamento transformou-se em amor pela ciência, sempre aliado a seu esforço e sua dedicação. A licenciatura em Biologia sempre foi seu sonho, mas para realizá-lo a professora enfrentou uma maratona de obstáculos: das condições precárias da vida rural à dificuldade de acesso ao ensino superior.

Do campo para a cidade

Márcia Ferreira vem de uma família de agricultores assalariados e conhece, de perto, a realidade do campo. "Eu sempre sonhei em sair da roça, para não depender da chuva para ter dinheiro e comida dentro de casa; deixar de ter as mãos calejadas; e ter condições de suprir as necessidades dos meus familiares", destacou.

Para a licenciada em Biologia, a Universidade sempre foi o caminho sonhado para a transformação da vida da sua família. "Muita gente dizia que filho de pobre não podia fazer faculdade, mas eu sabia que conseguiria, porque o bom da vida é sonhar. Quando chegou ao interior, a Ufal transformou a realidade de muita gente, como foi o meu caso", relembrou.

A pesquisadora soube aproveitar todas as oportunidades que a instituição ofereceu, como o auxílio estudantil – útil para suprir despesas com fotocópias, livros e passagens de ônibus. Sem renda suficiente para realizar a inscrição do vestibular, Márcia também ficou isenta da taxa cobrada aos candidatos e, para ingressar no Campus Arapiraca, estudou rigorosamente, como fez durante toda a vida escolar.

"A energia só chegou a minha casa em 2005. Antes disso, eu estudava sob a luz do candeeiro. Apesar de desgastar a minha vista, eu não perdia o foco... Como a universidade sempre foi a minha meta, eu lia tudo o que aparecia", revelou Márcia.

A persistência é uma das suas principais características. No ensino fundamental, após dias inteiros de trabalho na roça, ela caminhava seis quilômetros, à noite, para chegar até a escola. No ensino médio, a caminhada passou a ser de quatro quilômetros até o ponto de ônibus. Na graduação, o percurso tornou-se ainda maior.

"Eu caminhava ou pedalava três quilômetros até a pista que ligava Craíbas aos municípios vizinhos. Depois, pegava um ônibus para Arapiraca, onde eu pegava outro transporte coletivo até o campus. Na volta, eu refazia esse roteiro até chegar em casa", detalhou.

Excelência acadêmica

Apesar das dificuldades, Márcia encarou a vida acadêmica com dedicação e excelência. No final de 2010, antes de concluir a graduação, foi aprovada para o mestrado em Diversidade Biológica e Conservação dos Trópicos, do Instituto de Ciências Biológicas (ICBS) do Campus A.C. Simões, em Maceió. Já na capital alagoana, a pesquisadora – que só conheceu o mar aos 21 anos – desenvolveu seus trabalhos no Laboratório de Ciências Marinhas (Labmar), situado no Museu de História Natural (MHN), que tem vista para a orla da Pajuçara.

"Hoje, eu trabalho vendo o mar e em contato direto com os peixes. Eu consegui muita coisa por meio da Universidade... Para muitas pessoas, isso pode não ter significado especial, mas é muito importante para mim. Eu represento o contrário da frase 'filho de pobre não faz faculdade'. Não é fácil, mas é possível", ressaltou Márcia.

Além de ter acesso ao ensino superior, a estudiosa construiu uma trajetória respeitável na pós-graduação. Com pesquisas sobre a idade de crescimento de tainhas da Lagoa Mundaú, Márcia conquistou o 3º lugar em excelência acadêmica no Encontro Brasileiro de Ictiologia (EBI), realizado em fevereiro deste ano, em Olinda-PE. Ela também teve trabalho reconhecido no Encontro Nordestino de Zoologia, em 2011.

A passagem pela Universidade também rendeu à Márcia a primeira viagem de avião, com destino a Argentina. Na ocasião, a pesquisadora foi contemplada com um curso no país vizinho e auxílio da Ufal. Se a terra já era uma velha conhecida e o mar deixou de ser um estranho, seria o céu o limite para essa jovem pesquisadora?

Superação

As conquistas de Márcia têm sido um estímulo para os jovens de Craíbas, em especial para seus oito irmãos. Ainda repleta de sonhos e focada na carreira, a pesquisadora já reconhece as conquistas obtidas nos últimos anos.

"Minha história é de uma pessoa que venceu. Eu me sinto realizada, porque tudo foi muito difícil. O meu ingresso na Ufal foi motivo de orgulho para toda a família, eu passei a ser uma referência. Hoje, posso dizer que sou a primeira a ter um salário e a primeira graduada da minha família", salientou.

Fora de sua cidade natal, a pesquisadora também é referência para outros jovens. Em outubro de 2014, Márcia Ferreira voltou ao Campus Arapiraca, para ministrar minicurso sobre Ecologia dos Peixes, destinado a estudantes de licenciatura em Biologia. Segundo Márcia, regressar à Universidade como palestrante foi um dos momentos mais marcantes de sua vida.

"Foi uma emoção danada! É muito bom saber que já estive sentada naquelas cadeiras, como estudante, e voltei como profissional", refletiu.