Pesquisa investiga relação entre excesso de peso e desigualdade

Estudo observou tendência de obesidade e excesso de peso em adultos entre 2006 e 2017 e elaborou estimativa para 2022
Por Olívio Candido - estagiário de Jornalismo
06/08/2019 09h11 - Atualizado em 09/08/2019 às 15h10
Pesquisa mostra influência do tempo de estudo na relação com a obesidade. Foto: Pixabay

Pesquisa mostra influência do tempo de estudo na relação com a obesidade. Foto: Pixabay

A obesidade é considerada um dos principais problemas globais de saúde pública. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), atualmente, as doenças relacionadas à obesidade representam 67,3% de anos perdidos que poderiam ser evitados até 2040, ano que a OMS projeta o aumento de mortes prematuras. A estimativa é reflexo da qualidade e mudança dos hábitos alimentares nas últimas décadas, ações que contribuem para o agravamento de problemas como excesso de peso e obesidade. 

De acordo com dados de 2018 da Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas (Vigitel), mais da metade da população brasileira está acima do peso. A obesidade atinge um em cada cinco brasileiros. “Nós nos preocupamos muito com causas externas, violência e outras coisas, mas a obesidade mata muito mais que qualquer crime. Nós temos um pouco de dificuldade de entender essa problematização e a gravidade que isso representa”, alerta o professor da Faculdade de Nutrição (Fanut) da Ufal, Jonas Augusto Cardoso da Silveira. 

Ciente desta tendência, a pesquisadora do Programa de Pós-graduação em Nutrição da Ufal (PPGNUT), Mayara Oliveira de Alencar Santos, investigou a obesidade e o excesso de peso entre adultos. O tema é abordado pela ótica da desigualdade de gênero e escolaridade. A meta nacional de controle do excesso de peso de 2006 a 2017 foi avaliada e então, o trabalho elaborou uma estimativa para o ano de 2022, com base nas recomendações do Ministério da Saúde. O estudo foi contemplado com bolsa da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e orientado pelo professor Jonas Silveira. 

Obesidade é similar entre homens e mulheres, mas escolaridade influencia  

A partir dos dados obtidos dos inquéritos anuais da Vigitel foi construída uma série temporal da prevalência do excesso de peso e obesidade entre crianças e adultos; os dados foram estruturados em gênero e escolaridade. A finalidade do projeto é a formação de recursos humanos estratégicos na área de nutrição e saúde pública, além de oferecer subsídios para tomada de decisão na saúde. 

O material foi coletado dentro do contexto de um plano de ações estratégicas do Ministério da Saúde para o enfrentamento de Doenças Crônicas Não-Transmissíveis (DCNT) no Brasil de 2011 até 2022. O plano está em execução em conjunto com agenda internacional da OMS, após medida promulgada pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 1° de Abril de 2016, anunciando o início da década de Ações em Nutrição. 

A proposta surge após o reconhecimento da magnitude dos problemas de desnutrição e obesidade presentes em todo o mundo. Entre algumas das metas estabelecidas pelo Ministério da Saúde, estão a redução da obesidade em crianças e adolescentes, e a estabilização do crescimento da obesidade e excesso de peso em adultos. Os pesquisadores analisaram essas condições no período entre 2006 e 2017 e fizeram projeções para 2022, segundo gênero e escolaridade.

Os resultados da série temporal indicam que a prevalência de obesidade na última década foi similar entre homens e mulheres. Contudo, ao investigar a interação entre gênero e escolaridade foi notada uma tendência diferente entre adultos no Brasil. Nos homens, a escolaridade teve pouco efeito sobre o aumento da obesidade. No entanto, ao analisar o grupo das mulheres, os dados apresentados mostram que quanto menor o nível de escolaridade, maior a probabilidade do desenvolvimento da obesidade; e quanto maior o nível de escolaridade, menor é essa tendência, até mesmo em comparação aos homens de alta escolaridade. 

Os pesquisadores ainda mencionam a influência da indústria de alimentos na sociedade, destacando que, atualmente, é muito mais fácil alimentar-se mal. A alta disponibilidade e o custo de produtos de baixo valor nutritivo são os principais fatores para escolha de produtos de menor qualidade. “Na sociedade há escassez de alimentos saudáveis. Há um papel muito forte da indústria de alimentos com publicidade direcionada para crianças e adultos incentivando o consumo de alimentos ultraprocessados. Por conta disso, constrói-se uma sociedade doente, que é mais fácil você não ser saudável”, afirma o pesquisador. 

Mulheres mais escolarizadas podem atingir meta de saúde 

Os autores do trabalho chegaram à conclusão de que o único grupo que será capaz de atingir a meta do Ministério da Saúde para 2022 são mulheres com 12 anos ou mais de escolaridade, sendo pouco provável que os outros grupos analisados, homens de todos os níveis de escolaridade e mulheres com até 8 anos e com 9 a 11 anos de estudo atinja esta meta. 

Ao explicar essas desigualdades, o professor Jonas observa que o papel do homem na sociedade é estável, por este motivo, não recebe as influências externas de forma diferencial e preocupa-se menos com sua saúde. Por outro lado, as mulheres ficam mais expostas às condições que desfavorecem a produção do autocuidado, podendo citar as maiores jornadas de trabalho, que por vezes, há de ser conciliada em duas ou mais jornadas. “Esse fardo que colocam em cima das mulheres pode representar um risco na diminuição de autocuidados, seja com alimentação, atividades de lazer e com sua própria saúde”, ressalta. E questiona: “Imagine uma mulher que precisa cuidar de casa, trabalhar e ainda precisa estudar. Em que horário ela fará atividade física? Quando ela terá um momento para si?”. 

O pesquisador da Ufal afirma que o estudo vai auxiliar no reforço de atividades que foquem nestes grupos. “Nós podemos fazer uma leitura da escolaridade com a questão de renda no Brasil, que é muito forte e presente. Mulheres de baixa renda estão numa situação de maior estresse e de maior vulnerabilidade e, por vários outros fatores, elas também estão com maior risco para obesidade”, conclui.