“O Rio São Francisco foi meu primeiro amigo. E hoje, aos 77 anos, eu continuo sendo aquela criança curtindo o rio. Quando eu tô no rio, eu fico nadando, caio n’água e fico conversando com ele. A gente chegou num nível de amizade que a gente conversa, bate um papo, mas precisa que eu esteja sozinho, lógico, pra conversar com ele, né? Há uma espiritualidade entre nós e isso foi construído ao longo de toda a vida!”. Dessa forma, Antônio Jackson Borges Lima resume sua vida e sua relação com o Rio São Francisco, mais especificamente com a região do Baixo, onde nasceu, cresceu, aprendeu a pescar, a nadar, constituiu família e vive até hoje.

A dedicação de Jackson Borges, resumida e incorporada no cognome ‘Mestre do Rio’, destaca não apenas a relevância e empenho de um homem em defesa do meio ambiente, mas a referência que ele se tornou para gerações de barranqueiros, indígenas, quilombolas, pescadores, lavadeiras e pesquisadores do Rio São Francisco, que reconhecem nele a sabedoria e o conhecimento empírico de quem vivencia o rio diariamente e conhece, talvez como ninguém, sua história, sua gente, suas mazelas e suas potencialidades.

Como forma de reconhecimento a essa trajetória de vida, o professor Emerson Soares idealizou e o colegiado do curso de licenciatura em Ciências Biológicas, do Campus Arapiraca da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), propôs a concessão do título de Doutor Honoris Causa ao já popular “velho do rio”. A proposta teve como relatores os professores Gustavo Gomes, do Instituto de Educação Física e Esporte (Iefe); Isnaldo Barbosa, do Instituto de Matemática (IM); e Willamys Silva, do Campus Arapiraca; e foi aprovada por unanimidade, por meio de voto secreto, pelos 42 conselheiros presentes à sessão extraordinária realizada na última terça-feira (26), na Sala dos Conselhos Superiores da Ufal, no prédio da Reitoria, conforme Resolução nº 61/2023 anexa.

A expressão honoris causa vem do latim e significa “por causa da honra”. No mundo acadêmico, ela é usada no reconhecimento do trabalho de pessoas que demonstraram grande empenho em suas áreas de atuação, independentemente de sua formação educacional. Antes e após a votação, alguns presentes destacaram a trajetória e o caráter de Jackson Borges.

O professor José Vieira, coordenador das Expedições Científicas do Baixo São Francisco, foi um deles. “Das nascentes à foz, este senhor conhece o Rio São Francisco e tem a defesa ambiental atrelada à sua vida. Ele é bancário de profissão, aposentado, e, desde os seus 20 anos, tem uma dedicação quase que exclusiva ao rio. Nós nos qualificamos como doutores através de um título de universidade, e ele tem um título de doutor natural pela universidade da vida. Nesse percurso, ele criou um museu ambiental em 2003, o único museu de toda a bacia do São Francisco. Ele não tem nível superior, mas ele tem um nível superior da vida, que talvez nenhum de nós consiga ter”, destacou Vieira.

A vice-reitora Eliane Cavalcanti ressaltou o privilégio da convivência e o aprendizado contínuo com Jackson Borges. “Eu já o conhecia e conhecia o seu museu, mas a Expedição me deu a oportunidade de conhecer o trabalho dele a fundo, que não é restrito à parte ambiental, mas também tem uma militância política muito importante nesse país. Estar hoje participando desse momento, ter feito o memorial dele é uma alegria pela oportunidade da gente ver um catador de lixo, que transforma o lixo em museu, receber o título de Doutor honoris causa pela Universidade Federal de Alagoas, que é sempre pioneira em várias frentes e que reconhece o potencial do povo alagoano”, finalizou Eliane, emocionada e sendo acompanhada por aplausos dos presentes.

Outorga do título

A solenidade de outorga do título de Doutor Honoris Causa a Antônio Jackson Borges Lima será realizada no dia 10 de outubro, às 10h, no auditório da Reitoria, no Campus A.C. Simões. A cerimônia honorífica é aberta à comunidade universitária e à sociedade em geral.

Sobre o Museu

O Museu Ambiental Casa do Velho Chico, tão citado nas falas dos conselheiros, está sediado no centro da cidade de São Brás/AL, a cerca de 179km de Maceió, e a visitação é gratuita. O museu funciona de segunda a sexta-feira, das 8h30 às 11h, das 14h30 às 17h, e das 19h às 21h30. Para mais informações sobre o museu, siga o perfil @casadovelhochico.museu no Instagram, assista ao documentário A Casa do Velho Chico aqui ou entre em contato pelo e-mail museuambientalcasadovelhochico@gmail.com.