Três anos depois, comunidade avalia como Ufal reagiu à pandemia

Em 2020, aulas foram suspensas e a Universidade precisou se adaptar a uma realidade dramática
Por Lenilda Luna - jornalista
17/03/2023 11h54 - Atualizado em 20/03/2023 às 14h10

A Universidade Federal de Alagoas (Ufal) tomou uma série de medidas para lidar com a pandemia de covid-19, desde o início da crise, em 2020. Há três anos, a gestão precisou suspender a calourada, que seria realizada no dia 16 de março, para recepcionar os recém-aprovados. Estudantes que se preparavam para iniciar o semestre 2020.1 foram pegos de surpresa, mas a verdade é que não era possível compreender ainda a extensão dos danos causados pelo vírus SARS-CoV-2, que se espalhou rapidamente pelo mundo.

Pesquisadores, professores e gestores da Ufal buscaram informações e se reuniram, de forma permanente, para tomar as medidas necessárias. No dia 19 de março de 2020, o Conselho Universitário (Consuni) decidiu pela suspensão do calendário acadêmico. Mas a Universidade não parou. De forma dinâmica, as atividades acadêmicas foram adaptadas para o espaço virtual. “Nós tivemos que seguir as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS), adotando o distanciamento social”, relembrou o reitor da Ufal, Josealdo Tonholo. Assista aqui ao balanço das ações de um mês da covid-19.

O Hospital Universitário Professor Alberto Antunes (HU) recebeu leitos novos e criou uma ala para os pacientes de covid-19. “A Unidade Coronavírus do Hospital Universitário, em abril de 2020, abriu 14 leitos de UTI já com respiradores, monitores multiparamétricos e vários equipamentos para atender aos pacientes que entraram com complexidade por causa da covid-19”, explicou a vice-reitora da Ufal, Eliane Cavalcanti, que por seu conhecimento na área, já que é doutora em Ciências Biológicas, acompanhou várias das medidas emergenciais que a Ufal adotou naquele período.

O reitor Josealdo Tonho enfatizou, em vários momentos, a necessidade de seguir as recomendações dos sanitaristas e pesquisadores, cumprindo o isolamento. “A grande preocupação da Ufal foi preservar a vida e a saúde das pessoas, sem dispensar a aplicação do conhecimento científico para envolver a todos, para resguardar a saúde de toda a comunidade acadêmica e contribuir com o enfrentamento da crise sanitária, divulgando conhecimentos e medidas práticas para a sociedade alagoana”, destacou o reitor. Assista ao vídeo gravado no início da pandemia

Estudantes e servidores em casa

A pró-reitoria de Graduação (Prograd), organizou um formato para seguir com o calendário acadêmico. Foi lançado o Período Letivo Excepcional (PLE), a partir da resolução 34/2020, publicada em 8 de setembro de 2020. “As aulas síncronas começaram no dia 13 de outubro e foram realizadas no horário regular do estudante. Os professores tiveram flexibilidade para adotar os recursos utilizados nas aulas. Para isso, eles passaram por um período de capacitação para facilitar a interação nas plataformas digitais”, relembrou o pró-reitor de Graduação, Amauri Barros, enfatizando a importância do Programa de Formação Continuada em Docência do Ensino Superior (Proford) nesse processo de capacitação.

A Pró-reitoria Estudantil teve que acompanhar a situação dos estudantes de baixa renda que não tinham como se equipar para assistir às aulas remotas. “Nós tivemos três ações imediatas para os estudantes: auxílio para a compra de equipamentos, que atendeu a 100% da demanda que nos foi apresentada, cerca de 1,4 mil estudantes; editais para recebimento de pacotes de dados de internet, disponibilizando mais de 11 mil chips de telefonia móvel; e concedemos auxílio financeiro para a contratação de plano de internet. Também concedemos auxílio-alimentação para os estudantes que ficaram sem o Restaurante Universitário, além de outros auxílios”, relacionou Alexandre Lima, pró-reitor Estudantil. Leia aqui mais detalhes sobre as ações da Proest na pandemia.

Organizar o trabalho híbrido, inicialmente, depois completamente remoto, quando a situação se agravou, e depois o retorno presencial gradual, com a vacinação, não foi um desafio simples. Nesse período, a Pró-reitoria de Gestão de Pessoas e do Trabalho (Progep), com Wellington Pereira à frente, teve que ajustar as medidas a cada contexto sanitário. De início, a Coordenação de Qualidade de Vida no Trabalho (CQVT) realizou uma pesquisa on-line com servidores técnicos e docentes da Ufal para acompanhar o estado de saúde e do trabalho no contexto da pandemia. As capacitações foram transferidas para o ambiente virtual.

O psicólogo André Miranda, do Subsistema Integrado de Atenção à Saúde do Servidor (Siass), destaca os muitos desafios e impactos significativos em todos os aspectos da vida, inclusive no âmbito acadêmico e educacional. “A Ufal implementou uma série de ações para apoiar seus técnicos e professores, incluindo a oferta de capacitação e treinamento em plataformas virtuais e o suporte psicológico e emocional por meio de serviços de assistência estudantil e de saúde mental”, ressaltou o psicólogo.

O Plano de Contingenciamento setorial para o ano de 2021, com medidas adotadas pelos setores para diminuir o risco de contágio pela covid-19, também foi uma importante iniciativa, baseada nas ações do Protocolo de Biossegurança da Ufal. “Os profissionais de saúde do Hospital Universitário foram os mais expostos à covid-19 e, portanto, precisamos adotar medidas rígidas de segurança, como uso de equipamentos de proteção individual (EPIs) e testes frequentes de covid-19. Para os demais setores, de início adotamos o rodízio das equipes, para reduzir a quantidade de servidores no ambiente, com a obrigatoriedade de máscaras e a disponibilização de álcool em gel”, descreveu Pereira.

Conhecimento foi a chave

Foi preciso aprender, pesquisar, acompanhar e tomar medidas em tempo recorde. A Ufal montou uma Comissão de Gerenciamento da Covid-19, que foi composta por especialistas de várias áreas do conhecimento, inclusive do Hospital Universitário. Esta Comissão ficou em alerta permanente, fazendo a atualização frequente do panorama mundial, nacional e local, acompanhando os boletins e notas técnicas emitidos pelas autoridades federais e estaduais. “Esse comitê teve um papel fundamental na coordenação das ações e na tomada de decisões, garantindo uma resposta rápida e efetiva diante das incertezas e dos desafios impostos pela pandemia”, ressaltou o reitor Josealdo Tonholo.

As atividades de pesquisa voltaram-se para esse enorme desafio de sobreviver à pandemia. A Ufal participou do maior estudo sobre epidemiologia do coronavírus Epicovid19-BR, que testou 89 mil pessoas em 133 cidades. O estudo foi financiado pelo Ministério da Saúde e coordenado pelo Centro de Epidemiologia da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL). A professora do curso de Enfermagem em Arapiraca, Karol Fireman, participou do estudo na parte de coleta de dados. “Naquele momento, a pandemia estava no auge. Foi muito importante contribuir na identificação da quantidade de casos”, ressaltou a docente.

A pesquisadora lembra que não foi fácil, porque foi um período de medos e incertezas. “Não tínhamos ainda nenhuma previsão de vacina, então tivemos a necessidade de ter coragem para ir até as pessoas, assim como vários profissionais de Saúde que tiveram de suprimir o medo e realizaram esse trabalho pela população. Depois, iniciamos um monitoramento dessas pessoas, por telefone, tirando dúvidas durante o isolamento. Acredito que a Universidade é isso, estar junto da comunidade, fazendo o melhor possível, com base no conhecimento científico, buscando contribuir.”, lembrou Karol.

A Pró-reitoria de Pesquisa e Pós-graduação (Propep), sob o comando da professora Iraildes Assunção, coordenou as ações dos pesquisadores para a produção de conhecimento voltada ao enfrentamento da pandemia de covid-19. "Foi formando o Observatório Alagoano de Políticas Públicas para Enfrentamento da Covid-19, entre abril e maio de 2020, reunindo um grupo de pesquisadores de várias áreas. Em parcerias com a Fapeal [Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Alagoas], foi possível ampliar o número de bolsas de mestrado, doutorado e fomento à pesquisa em todas as áreas de conhecimento e com a Fundepes [Fundação Universitária de Desenvolvimento de Extensão e Pesquisa], foi possível concorrer aos editais institucionais em agências de fomento, como a Finep, resultando em aprovações de todas as propostas submetidas no período", pontuou Iraildes Assunção.

Ela ressalta que o apoio da Fundação, também foi muito importante para a concretização de colaborações com o setor produtivo do estado e vários acordos foram firmados com empresas nacionais e multinacionais. "No período, a gestão disponibilizou recursos da Ufal para atender a demandas reprimidas, algumas ações inéditas foram executadas, como por exemplo, o edital de bolsas de Apoio técnico aos laboratórios de equipamentos multiusuários, o edital de manutenção de Equipamentos multiusuários, editais de auxílio ao pesquisador, de Prêmio Ufal de Teses e Dissertações, ação inédita em nossa Universidade, e também inédita na Propep no sentido da priorização da igualdade de gênero; outra ação inédita na Ufal foi o edital de auxílio ao pesquisador para os cursos de pós-graduação profissionais. Todas essas ações foram fundamentais para subsidiar as pesquisas direcionadas ao enfrentamento da covid-19", concluiu a pró-reitora.

A professora Maria Aline Barros Fidelis de Moura, do curso de Farmácia foi uma das várias pesquisadoras que responderam a essa convocação para que a Universidade colaborasse com conhecimentos técnicos e científicos para superar a pandemia. “Mesmo enfrentando cortes de recursos e muitas perdas humanas, a Ufal continuou respondendo à sociedade com suas atividades intramuros e extramuros. Particularmente, tenho a sensação de dever cumprido, uma vez que o Centro de Informações Toxicológicas (Citox) atuou no âmbito da popularização da Toxicologia e no combate às fake news relacionadas à saúde das pessoas”, explicitou a pesquisadora.

Eliane Campesatto, professora e pesquisadora do Instituto de Ciências Biológicas e da Saúde (ICBS) e coordenadora do Grupo de Pesquisa em Farmacoterapia das Doenças Crônicas, também se desdobrou para evitar que as pessoas fossem submetidas a tratamentos sem eficácia, muitas vezes alimentados pelo desespero. “Alertamos sobre os riscos do chamado tratamento precoce, com medicamentos que não constavam no protocolo aprovado pela Anvisa e pela Organização Mundial de Saúde. Sem a prescrição correta, remédios como azitromicina, cloroquina e ivermectina apresentavam efeitos nocivos e não ajudavam na cura da covid-19”, recordou a cientista. Ouça aqui entrevista concedida naquele período

As testagens e a vacinação

Testagem e isolamento foram as principais estratégias quando ainda não havia a vacina contra a covid-19. Desde o início da pandemia, a Ufal colaborou nesse processo. Pesquisadores da Universidade ajudaram o Laboratório Central (Lacen) do Estado nas análises dos testes de diagnóstico do novo coronavírus. “Iniciamos contribuindo com cerca de 200 exames por dia. A Ufal colocou à disposição alguns equipamentos, a exemplo do Real Time PCR e uma centrífuga refrigerada, necessários para a realização dos testes da covid-19. Também auxiliamos com kits de detecção por PCR, que estavam escassos no mercado”, destacou o coordenador do Laboratório de Inovação Farmacológica (Laif), Marcelo Duzzioni.

No final de 2020, quando foram aplicadas as primeiras vacinas, também começou a pressão para que o governo federal garantisse a compra dos imunizantes para toda a população. A gestão da Ufal posicionou-se com firmeza neste momento, defendendo a vacinação em massa. “O Brasil tem competência e um histórico de sucesso nos programas de vacinação em massa, por isso, o SUS não pode ser canibalizado por órgãos do próprio governo federal. Nossa defesa é que a vacinação seja universal e gratuita, com a priorização de grupos realizada por especialistas na área”, enfatizou a nota pública emitida pela gestão da Ufal em janeiro daquele ano.

O dia 21 de janeiro de 2021 tornou-se uma data histórica para a Ufal. A primeira pessoa a ser imunizada foi a auxiliar de limpeza na Unidade Covid do Hospital Universitário, Maria Quitéria Ferreira Santos. O cronograma de vacinação continuou seguindo o Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a covid-19 do Ministério da Saúde, com as diretrizes da Secretaria Estadual de Saúde e da Prefeitura Municipal de Maceió. Todo o processo foi acompanhado com ansiedade pela maior parte da sociedade alagoana, cada pessoa aguardando a sua vez de entrar na fila da vacina e ganhar um reforço fundamental para vencer a covid-19.

A Unidade de Testagem do Campus Arapiraca, sob a coordenação da vice-reitora Eliane Cavalcanti, foi instalada para ajudar a quem precisava ser testado. Além de servidores e estudantes da Ufal, em Delmiro Gouveia e Arapiraca, a Unidade fez parceria com prefeituras para ampliar as testagens e os diagnósticos da população dos municípios.

Em 2021, todos os municípios ribeirinhos pelos quais a Expedição Científica do Rio São Francisco passou tiveram amostras da sua população testada, por meio de exames RT-PCR, para rastreio de covid-19. Todo esse trabalho comandado por Eliane Cavalcanti contou com apoio da gestão da Ufal no que se refere à logística das testagens.

A comunicação também é uma vacina

Não foi só contra a covid-19 que foi preciso vacinar as pessoas. Nesse período, tivemos que combater a viralização das notícias falsas. Informações controversas e teorias conspiratórias custaram vidas durante a pandemia. A comunicação institucional teve um papel fundamental para esclarecer o que era verdade e o que era pseudociência. Na Ufal, a Assessoria de Comunicação (Ascom) colocou todos os meios à disposição do combate às fakenews e para a veiculação das informações técnicas e orientações dos pesquisadores de várias áreas. Foram vários vídeos, programas de rádio, artes informativas para as redes sociais e textos para o site ufal.br produzidos pela equipe.

O Protocolo de Biossegurança foi diagramado, publicado e divulgado para toda a comunidade universitária. A revista Saber Ufal saiu com uma edição especial sobre a Universidade no combate à covid-19. Nas primeiras semanas de distanciamento social, vários projetos foram lançados no canal do Youtube da Ufal, como Ufal mais arte e cultura, com apresentações culturais organizadas pela Pró-reitoria de Extensão (Proex), por meio da Coordenadoria de Assuntos Culturais (CAC) da Ufal; aulas on-line do programa Conexões de Saberes, voltado para os estudantes das escolas públicas que se preparavam para o Enem; além do programa Ufal contra o Coronavírus, com várias entrevistas que orientavam sobre como preservar a vida, enquanto os cientistas buscavam a cura. Até a aula inaugural passou a ser on-line.

A Rádio Ufal e as redes sociais da Universidade também estiveram voltadas para disseminar conhecimentos científicos sobre a prevenção e o tratamento da covid-19. “No início era tudo muito incerto e não sabíamos ainda com o que estávamos lidando. Foi um trabalho muito difícil, mas mesmo estando atônitas, procuramos fazer parte deste mutirão para que a Universidade continuasse funcionando e atendendo à população. Nós produzimos muito e, enfrentando esse desafio, tivemos uma noção maior da importância da comunicação institucional trabalhando com ética, transparência e responsabilidade”, destacou Simoneide Araújo, coordenadora da Assessoria de Comunicação da Ufal.

Todo esse trabalho exigiu muito o suporte da equipe do Núcleo de Tecnologia da Informação (NTI). O diretor, Reinaldo Cabral destacou que o contexto da pandemia trouxe um panorama nunca vivido antes pela Ufal em que os recursos tecnológicos passaram a ser o único caminho possível para viabilizar a operação das aulas e a prestação dos serviços. “Mesmo com limitações dos repasses orçamentários do governo federal e dificuldades de infraestrutura de TI, o NTI contribuiu com dezenas de iniciativas para que a Ufal tivesse a segurança para elaborar o seu Período Letivo Excepcional (PLE) e manter sua operação no âmbito acadêmico e administrativo”, ressaltou o diretor

Memória e sobrevivência

Sobreviver ao período mais crítico da pandemia não foi fácil. Chegamos aqui, nesses tempos de flexibilização, vacinados e com reforços periódicos, graças ao empenho coletivo de pesquisadores do mundo inteiro e precisamos celebrar. Mas tivemos muitas baixas. No Brasil, foram 699.634 óbitos. A Universidade também se debruçou sobre esse drama. “A pandemia foi um período de muito pesar para toda a humanidade, principalmente para aqueles que perderam seus entes queridos. Os que tiveram a infelicidade de acompanhar de perto as vidas de seus parentes sendo ceifadas pela covid-19 sofreram ainda mais com a impossibilidade da despedida. Foi nesse contexto que o Memoráveis interveio para dar a sua contribuição”, ressaltou Mércia Pimentel, pesquisadora em Comunicação Social, que ficou responsável pelo projeto em Alagoas.

Como os velórios e rituais de despedida estavam proibidos, o projeto ofereceu um ritual on-line. “Pudemos oferecer aos familiares um pouco de acalento e a vivência do luto de forma digna a partir das homenagens realizadas. Contamos as histórias dos alagoanos que se foram e mostramos o quão importante foi conhecê-los para além das estatísticas apresentadas diariamente. Na Ufal, perdemos representantes de todos os segmentos (docente, técnico, estudantil e terceirizados). Certamente, os tributos produzidos levarão as histórias dessas pessoas para outros lugares, fazendo com que fiquem marcadas na memória coletiva da sociedade”, refletiu Mércia.

O poeta Alex Polari disse uma vez que “a morte pesa muito aos que ficam”. Na Ufal, perdemos pessoas da comunidade universitária, entre professores, técnicos e estudantes. Com pesar pelos que se foram e alívio pelos que ficaram, nós sobrevivemos a uma terrível pandemia, com dimensões que só conhecíamos de livros de história. Vimos cidades enormes com ruas desertas e tivemos que organizar uma rotina de cuidados contra um inimigo invisível. Vimos cenas de corpos amontoados que não serão esquecidas. Aprendemos, de forma drástica, que a informação científica e o espírito coletivo são importantes instrumentos de sobrevivência. E seguimos…

Para mais detalhes sobre como a Ufal enfrentou a pandemia, leia o livro Ufal na Luta pela Vida, de Elder Maia e Hiago Rocha, e a revista Saber Ufal, produzida pela Ascom.