Estudos ampliam atuação de Grupo de Pesquisa em Farmacoterapia

Atualmente no mundo estão em andamento 747 ensaios clínicos com humanos estudando tratamentos para a covid-19
Por Diana Monteiro - jornalista
05/08/2020 16h56 - Atualizado em 05/08/2020 às 18h22
Equipe do GFADOC

Equipe do GFADOC

O engajamento do Grupo de Pesquisa em Farmacoterapia das Doenças Crônicas (GFADOC), junto com a atuação da Universidade Federal de Alagoas no enfrentamento à covid -19, tem dinamizado a atuação de sua equipe com ações científicas e de repercussão social. O trabalho empreendido pelos pesquisadores, por meio de diversas atividades e parcerias, caminha em sintonia com o que desperta, atualmente, maior interesse da sociedade: acompanhamento da evolução do conhecimento para ações de combate e cura da pandemia.

A coordenadora do grupo, professora Eliane Campesatto,  enfatiza que, o grupo tem se esforçado para  oferecer, de forma dinâmica e compreensível,  as melhores interpretações de estudos científicos em sua área de conhecimento com divulgação em linguagem acessível.  A cada artigo publicado em revista científica, o grupo acessa o trabalho, interpreta e divulga em linguagem que possa ser entendida pela sociedade.  Mundialmente, a pesquisadora diz que nunca se estudou tanto nessa pandemia por SARS-CoV-2 e do quanto a ciência tem se destacado em produção e rapidez.

No contexto da farmacoterapia, a cada dia são publicados resultados de novos estudos científicos tentando mostrar eficácia ou não de um tratamento à doença. Estes estudos, segundo a pesquisadora, podem ser com células isoladas, em animais ou em humanos.

Na base de dados Clinical trials (uma base de dados que registra ensaios clínicos em andamento no mundo),  atualmente existem 747 ensaios clínicos com humanos estudando tratamentos para a covid-19 e destes, apenas 40 ensaios já foram completados. Do total geral dos ensaios, só 18 estão sendo conduzidos no Brasil, dos quais dois foram suspensos por problemas metodológicos.

Na busca da ciência de fármacos para a cura, diversas terapias vêm sendo utilizadas, consideradas ou propostas para o tratamento da covid-19, a maioria necessitando de apropriada avaliação de efetividade e segurança. No entanto, a recomendação atual, conforme a pesquisadora, é de que medicamentos sejam utilizados de acordo com o aparecimento e gravidade dos sintomas, pois não há uma terapia farmacológica específica para a doença.

“Entre 80 e 85% dos casos de covid-19 são leves, e na maioria das vezes não necessitam medicamentos e hospitalização, apenas permanecer em isolamento respiratório domiciliar, com as medidas não-farmacológicas como: repouso, hidratação, alimentação adequada. Aproximadamente 20% dos pacientes necessitarão de internação hospitalar e cerca de 5% irão necessitar de Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Os medicamentos sintomáticos são direcionados  para estes 20% dos pacientes”, frisa Eliane.

Em relação à prevenção da covid-19, ela enfatiza que não existem evidências científicas de que os fármacos disponíveis no Brasil e já utilizados em alguns locais, a exemplo da Ivermectina, cloroquina/hidroxicloroquina, vitamina C ou D e Zinco, sejam capazes de evitar a instalação da doença em indivíduos não infectados. Em estudos in vitro com vírus como da dengue, HIV, Influenza, febre amarela e Zika vírus, a Ivermectina apresentou atividade antiviral considerável. No entanto, a pesquisadora diz que a eficácia não foi confirmada quando da realização dos testes em animais ou humanos.

O medicamento é um antiparasitário de amplo espectro e que as evidências científicas para o uso na covid-19 são muito baixas, uma vez que os estudos realizados são in vitro e apesar de vários ensaios clínicos estarem em andamento e alguns já concluídos, ainda não foram publicados. Sobre o uso da Ivermectina e sua eficácia ou não para tratamento ou prevenção à doença, Eliane explica que toda a polêmica sobre esse medicamento se deu pela publicação de um estudo recente in vitro utilizando-o contra SARS-CoV-2, que revelou que ele pode inibir a replicação viral. "O título do artigo, altamente sugestivo, deu a entender que a Ivermectina era aprovada pela FDA para covid-19: The FDA-approved Drug Ivermectin inhibts the replication of SARS-CoV-2 in vitro”.

 A pesquisadora adianta que uma preocupação em relação a esse estudo é de que as concentrações sanguíneas de ivermectina alcançadas durante a terapia padrão são muito mais baixas do que as concentrações relatadas como inibidora da SARS-CoV-2 no estudo. Para se ter um efeito antiviral importante, segundo Eliane, seriam necessárias doses elevadas, ou seja, mais de dez vezes a dose utilizada clinicamente, que poderiam promover efeitos adversos como neurotoxidade, por exemplo.

Sobre a cloroquina (CQ) e a hidroxicloroquina (HC) na prevenção ou no tratamento da covid-19 (precoce ou tardia), Eliane afirma que as evidências disponíveis até o momento não sugerem benefício clínico significativo. As duas drogas são utilizadas há muitos anos na prevenção e tratamento da malária e de doenças inflamatórias crônicas, como por exemplo, Lupus Erimatoso sistêmico e reumatoide. A atividade antiviral in vitro, células isoladas de SARS-CoV-2, da CQ e HC foi relatada, no entanto, em seres humanos faltam evidências científicas para seu uso.

Alguns estudos clínicos sugerem benefício do uso da cloroquina ou da hidroxicloroquina na covid-19, porém são estudos com limitações metodológicas. Cita como exemplo, um muito famoso conhecido como “Estudo de Detroit”, onde 2541 pacientes hospitalizados com coronavírus foram investigados de forma retrospectiva. O tratamento com HC em combinação com azitromicina foi associado à redução de mortalidade. No entanto, problemas metodológicos, como por exemplo, a administração maior de glicocorticoides entre aqueles que receberam HC e razões incertas pelas quais alguns pacientes com doença grave não receberam HC por protocolo, limitam a confiança nesse estudo.

“Neste momento ainda tão difícil da pandemia no nosso país, tentamos esclarecer, colaborar e divulgar as principais evidências científicas para que a população tenha acesso a informação do tratamento mais adequado, eficaz e seguro e não acreditem em curas milagrosas”.´

Ciência e investimento

Pesquisadora e doutora na área de Farmacologia, Eliane aproveita para destacar o papel da ciência no desafiante contexto. “Em tempos de pandemia, a esperança da descoberta de um medicamento ou uma vacina contra o coronavírus tem aberto à ciência um espaço de visibilidade nunca visto antes na mídia e na população em geral. A procura por algo que previna, cure e possa salvar vidas, tem mostrado como os investimentos em ciência e tecnologia podem promover resultados benéficos a curto e a longo prazos. O resultado de estudos científicos tem norteado os clínicos no mundo todo no tratamento”.

Ela aproveita para destacar a importância de investimento direcionado aos estudos com foco na pandemia e a necessidade de garantir o fortalecimento, crescimento e viabilidade financeira como suportes determinantes para que a ciência desempenhe o seu papel: “Esperamos que mesmo após o fim da pandemia estes investimento em pesquisa continuem, e que o mundo entenda que a ciência é fundamental para sobrevivência humana e deve ser prioridade”.

Atividades

O Grupo GFADOC é vinculado ao Instituto de Ciências Biológicas e da Saúde (ICBS) da Ufal e tem como objetivo a elaboração e desenvolvimento de estratégias para implantação de cuidados farmacêuticos a pacientes portadores de doenças crônicas transmissíveis e não transmissíveis do estado de Alagoas. Para as ações, conta com parcerias, como, Hospital Universitário (HUPAA), Hospital Hélvio Auto, Secretarias de Saúde de Maceió e do Estado e Rede de Farmácias Pague Menos. Em parceria com a Pró-reitoria de Extensão (Proex), o grupo organizou em maio o 1º Simpósio de Farmacoterapia das Doenças Crônicas do GFADOC com lives Temáticas. O evento reuniu renomados palestrantes e 600 participantes de várias regiões do país.

Com menos de um ano de criação, o Grupo de Pesquisa já conta com resultados positivos de intervenções relativas a pacientes diabéticos, pacientes com HIV/AIDS em uso de antirretrovirais e vislumbra um impacto significativo do acompanhamento farmacoterapêutico nas demais doenças crônicas. Entre os projetos aprovados, há um com pacientes asmáticos. Há também outro, em fase de aprovação, que objetiva avaliar a efetividade e segurança de diferentes esquemas terapêuticos utilizados na covid-19 em Alagoas.

As atividades dos pesquisadores podem ser acompanhadas  por meio instagram @gfadoc.ufal, com postagens regulares sobre ações desenvolvidas, incluindo os projetos de pesquisa e extensão.  Atualmente o grupo vem publicando atualizações sobre o tratamento farmacológico da covid-19 considerando as melhores evidências científicas disponíveis sobre o assunto.