Ufal e Sociedade entrevista Claudia Mura sobre questões indígenas

Confira a transcrição da entrevista no programa

26/08/2019 11h00 - Atualizado em 23/09/2019 às 11h43
Cláudia Mura entrevistada por Lenilda Luna na Radioweb Ufal

Cláudia Mura entrevistada por Lenilda Luna na Radioweb Ufal

A entrevistada da semana no programa Ufal e Sociedade, da Radioweb Ufal, foi a professCláudia Mura, antropóloga especializada em questões indígenas. Confira:

Lenilda Luna: estamos iniciando mais um programa Ufal e Sociedade aqui na rádio Ufal e hoje nós vamos conversar com a professora Claudia Mura, que é antropóloga do Instituto de Ciências Sociais da Ufal, é italiana e está aqui na Ufal há seis anos e conhece bastante a realidade indígena. Já pesquisou a realidade indígena no Brasil e no Nordeste. Professora, vamos começar, então, por aí, por essa pesquisa, pelo trabalho que a senhora realiza atualmente em dois grupos de pesquisa, de etnologia indígena e principalmente no grupo identidades, território e conflito. Fale um pouco sobre esses grupos de pesquisa e o que eles estão realizando aqui na Ufal.

Claudia Mura: Bom dia, Lenilda. Bom dia a todos. Agradeço muito a oportunidade. Esses dois grupos de pesquisa envolvem também outros pesquisadores como o professor Evaldo Mendes, o professor Wendell Ficher que é sociólogo, e a professora e antropóloga Jordânia de Araújo Souza. O grupo de pesquisa Identidades, Território e Conflito tem uma proposta interdisciplinar e não aborda apenas grupos indígenas, mas também outros grupos étnicos, bem como movimentos sociais. Estamos orientando alunos que realizam pesquisas sobre diferentes temáticas e com diferentes grupos, não apenas indígenas. Como pesquisadores, acreditamos ser fundamental compreender mais profundamente a temática indígena, como essas populações têm resistido de diferentes maneiras e em diferentes situações históricas aos processos de dominação que têm sofrido e que ainda sofrem.  Como elas têm reelaborado e atualizado constantemente a própria cultura, seus princípios organizacionais e cosmológicos a partir dos contextos experienciais marcados por relações de dominação e na interação com outros grupos sociais e outros grupos étnicos. Consideramos necessário aprofundar o conhecimento da presença e protagonismo indígena, pois é extremamente importante reconhecer e valorizar a atuação dessa parcela da população que, embora tenha sido invisibilizada de diferentes formas, participou substancialmente da construção do país, deste país que é o Brasil. Estamos orientando pesquisas sobre conflitos territoriais, educação diferenciada indígena, saúde indígena, organização social e política, cosmologia entre outras temáticas, cujos resultados são importantes para melhor compreender as especificidades que os grupos apresentam e que precisam ser tomadas em consideração para que as políticas públicas a eles dirigidas sejam aprimoradas. Não se trata de análises que visam compreender apenas o momento atual, caraterizado por um recrudescimento da violência contra os grupos indígenas, mas investimentos em pesquisas que visam compreender a violência que foi sempre exercida em relação às populações indígenas, a partir de abordagens antropológicas, sociológicas e históricas.  É muito importante compreender que, em diferentes situações históricas, a construção de narrativas e de representações sobre os indígenas têm constantemente legitimado essas violências. Que tipo de representação são essas? Que tipo de narrativas e histórias foram construídas? A própria construção da história da nação brasileira tem excluído os indígenas, tem os colocados à margem de tudo, inclusive à margem da economia, e nunca foram pensados como produtores de valores, produtores de riquezas, produtores de cultura. Além dessas questões é preciso compreender como concretamente, através dessas experiências, essas populações têm conseguido resistir e se atualizar. Se tem muita dificuldade em reconhecer o protagonismo histórico dos indígenas, pois foram representados ou como brabos ou como criminais ou como representantes de um passado. São representações que veiculam imagens altamente estigmatizantes, exóticas, românticas e que os remetem somente ao passado, por isso a sociedade apresenta dificuldades em compreender os indígenas contemporâneos, pois não respondem às imagens estereotipadas que foram construídas sobre eles. Eles não pertencem ao passado e não pertencem apenas ao espaço geográfico da Amazônia, como algumas imagens os associam através dos estereótipos. Temos indígenas aqui em Alagoas, temos indígenas no Nordeste, temos indígenas em todo o território brasileiro com especificidades que a gente precisa compreender bem melhor.

Lenilda Luna: É, isso é tão forte, professora, que mesmo as pessoas aqui em Alagoas que têm alguma origem indígena, nós não temos essa linhagem assim, nós não temos esse reconhecimento, não sabemos muito de que povo indígena nós viemos e pertencemos. Isso existe porque em Alagoas é uma grande miscigenação, muitas das pessoas que vivem nas cidades são descendentes indígenas e não reconhecem a sua descendência e tem imagens como a senhora falou, de indígenas que são isolados, como se indígenas não estivessem presentes hoje na nossa sociedade, dirigindo carro, fazendo faculdade e trabalhando, usando o celular. Esse estereótipo que não permite que a gente compreenda o indígena de hoje.

Claudia Mura: Não compreende o indígena de hoje porque não compreende as múltiplas histórias em contextos diferentes. Se pensarmos na região Nordeste, não apenas, mas por ela ser de antiga colonização precisamos compreender melhor esse processo de miscigenação, inclusive as políticas de mistura forçada que os indígenas sofreram. Muitas pesquisas têm se debruçado em compreender esses processos como, por exemplo, desde os aldeamentos missionários já se praticava uma política forçada de mistura. Nesses aldeamentos, gerenciados pelos missionários, confluíam forçadamente indígenas de diferentes grupos étnicos e negros, além dos colonizadores portugueses. A ideia principal foi misturar forçadamente para converter os indígenas ao cristianismo, convertê-los, integrá-los, assimilá-los para que eles se tornassem trabalhadores nacionais, negando-lhes a diferença e especificidade étnica. É importante compreender melhor esses processos de violência que os indígenas sofreram, essas políticas de mistura forçada, e como determinados grupos, apesar do desmembramento e do genocídio, conseguiram em determinados momentos se rearticular. As famílias indígenas, inclusive, com suas próprias identidades, embora já com marcas da mistura, elas ainda conservavam, atualizavam princípios e aspectos culturais. Nós precisamos compreender esses processos de atualização e como eles constroem projetos de futuro conjunto, como conseguem se articular a partir de princípios organizativos também específicos. Somos tendencialmente orientados a pensar em alteridades totalmente diferentes, um Outro totalmente diferente, mas precisamos conhecer e reconhecer que os indígenas incluíram, nos próprios estoques culturais, elementos que não são originários da tradição indígena. Eles os incluíram, reelaboraram, atualizaram, portanto, a diferença cultural é constantemente construída e atualizada. Não podemos pensar sempre que são as tradições milenares que se reproduzem constantemente sem nenhum tipo de alteração. Os indígenas estiveram e estão em contato constante com outros grupos, tanto grupos étnicos como agências diferentes, como igrejas, como as Universidades. Inclusive, agora temos finalmente indígenas nas universidades. Isso é algo extraordinário se pensarmos que foram sempre colocados à margem, exterminados ou tutelados e nunca puderam falar por eles mesmos. As narrativas e imagens sobre eles que mencionei antes reproduziram essas formas de dominação e violência, alternadamente. Uma legitimava o extermínio e outra a tutela. Na verdade, foram dois tipos de narrativas sobre indígenas que se alternaram constantemente, uma que legitimou o extermínio e a outra que legitima a tutela. A tutela significa pensar essas populações como incapazes de falar por elas mesmas. A tutela é uma forma de dominação que claramente sufoca os próprios indígenas e não permite que eles falem por eles mesmos.  Se olha para essas populações de forma desconfiada e, portanto, através da tutela se intervém constantemente sobre elas, pois se pensa que é necessário corrigi-las, entende? Se, por um lado, temos uma ideia que as populações indígenas precisam ser protegidas, precisam ser tuteladas, as populações indígenas apresentam-se como protagonistas de seus caminhos, sobretudo a partir da década de 70 quando explode finalmente o movimento indígena. Nesse período, houveram diferentes articulações dos povos indígenas no Brasil e a voz deles começa a chegar à opinião pública. Quando eles começam a falar por eles mesmos é que finalmente a opinião pública começa a ser sacudida. O senso comum continua sendo reiterado, inclusive, pela propaganda anti-indígena e que não permite escutar essas vozes, que tenta barrar essas vozes que estão dizendo: nós estamos aqui, nós somos capazes de construir os nossos projetos políticos para o nosso futuro e temos uma diversidade enorme dentro do país. Embora haja enorme heterogeneidade entre as populações indígenas, há pautas em comum como terra, educação e saúde, mas principalmente a terra e, justamente a terra, que se torna o alvo dos ataques que atualmente estão se intensificando, a partir do novo governo Bolsonaro.

Lenilda Luna: Então nós tivemos nessas últimas décadas uma luta bastante grande para que a opinião pública apoiasse a demarcação das terras indígenas e agora é justamente isso que está sendo atacado, a capacidade e o direito desses índios de gerirem o seu território.

Claudia Mura: Exatamente. Digamos que sempre os indígenas sofreram ataques, embora a Constituição, especialmente o artigo 231, garante o direito à terra, à reprodução física e cultural da população indígena. Nunca foi fácil alcançar a demarcação das terras indígenas, senão já teríamos essas terras demarcadas. Há muito tempo que as populações sofrem para alcançar essas demarcações, mas, é claro, a partir do começo do mandato Bolsonaro, esse ataque contra a garantia dos direitos indígenas tem se intensificado. Para a gente não é surpresa, para os indígenas também não é uma grande surpresa. Desde antes do começo desse governo, Bolsonaro havia falado que não haveria mais nenhum centímetro de terra demarcada. E, desde o começo do mandato, ele apresentou medidas provisórias para esse fim. A primeira foi a 870 que tentava extinguir alguns ministérios e também reorganizar outros e a Funai ia passar do Ministério da Justiça para o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, encabeçado por Damares Alves. Essa medida retirava da Funai a função da demarcação das terras e a passava ao Ministério da Agricultura. Então, essa medida provisória impulsionou uma fortíssima mobilização dos indígenas e, finalmente, o congresso recusou essa MP. Portanto, vemos mais uma conquista do movimento indígena. Depois, o governo Bolsonaro, não satisfeito com essa derrota, apresentou mais uma Medida Provisória, a 886, que tentava tirar a diretoria mais estratégica da Funai que é a Diretoria de Proteção Territorial para passá-la ao Ministério da Agricultura. Felizmente, o Ministro Barroso do STF tem recusado essa Medida Provisória. Esses ataques não foram suficientes, e continua-se construindo outras estratégias para obstaculizar a demarcação das terras indígenas. A última é a colocação do novo presidente da Funai. Um delegado da polícia federal que tem assessorado, inclusive, a CPI da Funai e Incra. Ele tem assessorado a bancada ruralista, portanto, colocá-lo na presidência da Funai, que é o órgão de proteção aos indígenas, significa manter o controle absoluto do órgão, seu controle político, para que as demarcações não se efetivem.

Lenilda Luna: são desafios enormes professora, porque os pesquisadores se debruçaram também sobre a história, sobre essa questão de identidade cultural, essa questão de religiosidade. Tem vários aspectos, mas, essa questão política agora, territorial, ela é tão urgente que mobiliza além de uma ação de pesquisa acadêmica, ação política mesmo, uma tentativa de influenciar a opinião pública de se colocar, de defender esses territórios, essas populações indígenas hoje.

Claudia Mura: Lenilda, acho que você está tocando em um ponto extremamente importante. A gente precisa pensar que a nossa atuação, as nossas pesquisas, precisam ser de alguma forma, sensíveis às situações e condições que essas populações vivenciam. É de extrema importância compreender as construções culturais, as identidades sociais e culturais dessas populações, os aspectos religiosos, organizativos, as cosmologias, mas esses aspectos religiosos, essa cosmologia e religiões, elas são também atualizadas a partir de relações, inclusive, de dominação que os povos indígenas têm vivenciado ao longo de séculos. Então, a gente não pode pensar apenas em uma especificidade cultural que se reproduz como se fossem resultados de isolados sociais sem nenhum tipo de influência. Seria reiterar uma visão totalmente romântica, idealizada desses indígenas.  Então, acho que as nossas pesquisas precisam tomar em consideração as demandas dessas populações, compreender como elas, por exemplo, gerenciam os próprios territórios, como elas vivenciam esses territórios, as reivindicações que apresentam e também como as formas de dominação se reproduzem, e como elas conseguiram resistir a essas formas de dominação. Esses são alguns objetivos das pesquisas que se afastam da reprodução de uma ideia romantizada dos indígenas e pensamos que, como pesquisadores temos a responsabilidade de produzir novas narrativas, inclusive e especialmente junto com os indígenas. Acho que é extremamente importante pensar a produção acadêmica, não como uma produção apenas acadêmica, como se fosse desvinculada de seu próprio contexto histórico e político. A antropologia, como disciplina, não é mais aquela do século passado. A antropologia tem se atualizado, regenerado e complexificado através de inúmeras críticas, inclusive, às produções que envolvem os grupos indígenas e às abordagens que no século passado têm reproduzido imagens bastante distorcidas dos povos indígenas. Mas nas últimas décadas a gente tem ferramentas teórico metodológicas e éticas muito mais refinadas. A ciência se repensa e se complexifica, e a relação com os povos indígenas não permite mais representá-los de forma distanciada temporalmente e espacialmente. Absolutamente não. É necessário pensar a produção acadêmica como fruto de uma relação e construção dialógica. Nesses casos, os pesquisadores são percebidos como aliados.  Então, as questões políticas não estão fora da academia, as questões políticas são extremamente importantes de serem abordadas, os próprios indígenas querem que a gente se debruce sobre essas questões para compreendê-las mais profundamente, aproximadamente e conjuntamente.

Lenilda Luna: Até por ter muitos desses indígenas que estão também se reconhecendo. Não é fácil para eles só ter um descendente indígena dentro da cidade, dentro da vida mesmo como moderna, como se dá a humanização, ele teve que sobreviver, trabalhar e muitas vezes, ele se perde dessa tradição indígena e com esses movimentos, ele resgata essa história. Tem algumas coisas que são possíveis de serem conhecidas, outras não mais, assim, linguagem mesmo, a linguagem própria dos indígenas em algumas aldeias, em alguns territórios aqui em Alagoas mesmo, não é possível mais resgatar em outros. Eu soube de algumas pesquisas aqui dentro mesmo da Universidade em que se conseguiu fazer uma cartilha de (yatê?) que é uma linguagem indígena de uma aldeia de Pernambuco mas isso não vai se conseguir em todos os lugares, como é que você vai resgatar como se falava os povos originários depois de séculos e séculos dessa miscigenação forçada que a senhora colocou?

Claudia Mura: Acho que o que você está dizendo, Lenilda, é que o indígena precisa resgatar a própria cultura para ser reconhecido como tal. E não se trata disso, ou não apenas disso. Não todas as pessoas que sabem que têm ascendência indígena vão se sentir e reconhecer como indígenas. O sentido e sentimento de pertencimento ao grupo indígena é muito mais complexo. Os grupos indígenas são grupos étnicos e eles não habitam apenas nas terras indígenas, como você bem disse. Estão aqui na cidade, estão aqui na Universidade, etc, mas eles se reconhecem como pertencentes a um grupo pela história compartilhada com seus pares, pela luta conjunta, por participarem ativamente da reformulação dos próprios estoques culturais e projetos, não apenas por resgatar o que a gente pensa que se perdeu. A gente não pode continuar pretendendo que os indígenas façam isso. Os indígenas têm suas próprias especificidades, eles conseguem se rearticular socialmente e politicamente. As mudanças e o sentimento de pertença, não podem ser negadas. Precisamos compreender que são pessoas que experienciaram uma mesma história, que têm diversas trajetórias, e que repensam essa história, seu passado e daí se articulam para construir seus próprios futuros, seus projetos de futuro. Aqui em Alagoas, sim há indígenas, tem 12 grupos indígenas. Eles têm sofrido ataques de todo tipo, especialmente por não serem reconhecidos como indígenas porque não apresentam essas características estereotipadas que foram construídas e veiculadas nas narrativas que mencionei antes. Então, reconhecer que existem grupos indígenas significa reconhecer que eles têm capacidade de se atualizar, de ser protagonista da própria história, que eles foram escravizados, depois submetidos a trabalho compulsório, como por exemplo no sistema de patronagem, e a formas de dominação que a historiografia não tem mostrado. Mas nos últimos anos, as pesquisas vêm mostrando como a “história oficial” digamos assim, entre aspas, tem ocultado todas as formas de dominação e como os indígenas as têm encarado e têm construído suas próprias formas de resistência.  Por via desse ocultamento, as pessoas pensam que os indígenas que estão reivindicando terra em Alagoas ou no Nordeste não são indígenas. Como assim? Eles são indígenas sim, eles fizeram e fazem parte da história de Alagoas, fazem parte do Brasil.  Eles contribuem ativamente para a construção deste país, basta só pensar que eles foram trabalhadores, inclusive, de muitas obras públicas em diferentes cantos do Brasil. Não por isso deixaram de ser indígenas. Continuaram mantendo suas próprias práticas culturais e seus próprios princípios organizacionais, suas formas de resolução de conflitos, sua forma de gerenciar o próprio território. A gente não pode pensar neles como descendentes ou resíduos daquilo que os indígenas foram um dia. Os indígenas são nossos contemporâneos, são sujeitos históricos e a gente precisa conhecê-los mais e melhor.

Lenilda Luna: Justamente isso, professora. Como é que a partir dessas pesquisas antropológicas, dessa produção acadêmica, nós, a sociedade de um modo geral, podemos reconhecer melhor os nossos indígenas e saber mais da nossa história e também ter conhecimento do hoje? Não buscar o indígena que foi na época da colonização mas quem é o indígena hoje? Quais são os direitos que os indígenas têm hoje dentro de Alagoas? Direito a seus próprios territórios, direito a sua organização específica, como reconhecer isso? Como que a gente pode colocar apresentar esse movimento indígena de hoje para a sociedade?

Claudia Mura: A primeira coisa é aprender a escutá-lo, visto que não é tão fácil assim, considerando que temos muito preconceitos que impedem reconhecê-los. Então, reconhecê-los como sujeitos, significa, principalmente, vê-los de uma outra forma, desconstruir esses preconceitos. Esse movimento de escuta e de diálogo é já um passo para reconhecê-los como sujeitos. Nós, como pesquisadores, precisamos continuar fazendo pesquisas junto com eles, construir os nossos projetos de pesquisa a partir das demandas que expressam, e é também importante abrir espaços para que essas vozes possam ser escutadas. A gente tem muitos indígenas aqui na Ufal, inclusive em nosso programa de pós-graduação em antropologia social que é recente, já temos um indígena Xukuru-Kariri do município de Palmeira dos Índios, cursando com a gente. É um indígena formado em História e, atualmente, está se apropriando das ferramentas antropológicas. Ele está trazendo outras vozes e saberes. A produção dos indígenas começa a crescer e precisa ser divulgada e lida. É extremante importante, até pelas críticas que nos dirigem. Precisamos abrir espaços para que essas vozes sejam ouvidas e que possamos construir diálogos muito mais profícuos e menos assimétricos. 

Lenilda Luna: e a gente espera então que a sociedade neste momento busque essa compreensão para que possa defender para que a gente não retroceda, para que essas populações indígenas não percam direitos importantes e que a gente tenha uma nova onda de extermínio de mortos, professora. Porque os indígenas já foram tão marcados aqui em Alagoas mesmo, como é conhecida a história dos Caetés que foram dizimados.  A gente não tem história de resistentes e sobreviventes do que foi o genocídio dos Caetés, então, a gente não quer que isso se repita na nossa história.

Claudia Mura: Eu acho que está se repetindo sim. Infelizmente, não é apenas a história dos indígenas Caetés, mas de muitos outros, no passado e no presente. Os indígenas estão sendo ameaçados, violências estão sendo sofridas aqui mesmo em Alagoas. Os índios se sentem constantemente ameaçados, os conflitos têm se acirrado nos últimos tempos, claramente pela situação conjuntural atual. Continuam se perpetuando essas ideias que sustentam formas tanto de extermínio, quanto de tutela. Então, infelizmente, ainda estão sofrendo muita violência no país todo. Se pensarmos nos Guarani no Mato Grosso do Sul que continuam sendo exterminados, não podemos negar essa realidade. Então, é necessário reiterar que os direitos indígenas, arduamente conquistados, que constam na Constituição continuem sendo garantidos e efetivados porque se não a violência contra os povos indígenas irá continuar e se perpetuar.

Lenilda Luna: professora, a gente teria que aprofundar muito mais esse debate. Vamos ter que criar novas oportunidades, isso porque, ela é muito séria. Mas, em função do tempo, eu agradeço a senhora a participação de hoje e fica assim esse programa em aberto que, na verdade, eu acho que precisa muito mais diálogo dentro da universidade e em toda a sociedade sobre essa questão tão séria que nós estamos vivenciando.

Claudia Mura: Com certeza. Eu que agradeço a oportunidade.

Lenilda Luna: O programa Ufal e Sociedade dessa semana fica por aqui e você pode ler a transcrição dessa entrevista no site da Ufal. Até a próxima segunda.

Ouça a entrevista aqui