Ufal forma primeiros profissionais graduados em Letras-Libras

São 16 profissionais aptos a atuar no processo de ensino/aprendizagem e inclusão social
Por Diana Monteiro - jornalista
19/06/2019 12h22 - Atualizado em 19/06/2019 às 15h02
Primeira turma de Letras-Libras da Ufal

Primeira turma de Letras-Libras da Ufal

No desafiante mercado de trabalho, faz parte do planejamento de muita gente galgar degraus para o alcance de objetivos motivados pela perseverança, superação de obstáculos, vontade de crescimento pessoal e realização profissional. E quando os desafios, potencializados por diversas batalhas para a inserção social que se almeja, são transpostos, só cabe comemoração como expressão de vitória e conquista.

A Ufal é a única instituição de ensino superior de Alagoas a ofertar a graduação em Letras-Libras. E ao colocar no mercado de trabalho a primeira turma com 16 graduados, por meio da Faculdade de Letras (Fale), reforça o seu papel de inclusão social. A instituição também se  consolida como referência nessa área pela qualificação de disseminadores conectados com o processo do ensino/aprendizagem na reprodução do conhecimento.

A oportunidade para o processo de inclusão social é reconhecida pelo recém-formado Lucian Islan Marcelino Santos que vislumbra um futuro promissor. Na continuidade dos estudos, diz estar em seu planejamento uma pós-graduação e a pretensão de inserção no mercado de trabalho por meio de concurso público.

Ao se reportar à árdua luta e da felicidade, como ele mesmo diz, por conseguir “chegar onde chegou”, fala orgulhosamente: “Nunca imaginei em ser aprovado no vestibular para o curso de Letras-Libras, porém, sinto-me prestigiado e sou grato pela oportunidade que tive que me levou a ter um curso superior. Tornei o único da família a me graduar e a ser referência para meus sobrinhos”, diz emocionado.

Natural do município de Arapiraca Lucian, que tem deficiência auditiva, mas sem surdez profunda, é o caçula dos três irmãos e concluiu as primeiras etapas de sua formação em escolas daquele município. Ele afirma que, durante os quatro anos da graduação na Ufal, teve como maior expectativa melhorar o aprendizado, onde disse ter obtido êxito.

Aliado qualificado no processo de inclusão social liderado pela Ufal, por se tornar um profissional em Letras-Libras (licenciatura), o desafio do ensino/aprendizado pautou o seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) direcionado ao contexto da Educação de Jovens, Adultos e Idosos (EJA).

Sob a orientação da professora Edineide Silva, o TCC que desenvolveu trata sobre Diagnóstico linguístico preliminar dos surdos idosos: reflexões acerca de método de ensino/aprendizado da libras como L1, na Educação de Jovens, Adultos e Idosos (EJA).

“O objetivo do trabalho foi registrar, analisar, sugerir e difundir práticas pedagógicas de ensino-aprendizagem da Libras, como L1. Também explicar algumas estratégias a serem consideradas na produção de material didático para surdos do ensino-fundamental – anos iniciais - na modalidade EJA”, afirma Lucian, aproveitando para mensurar a importância do estudo para ampliar seu conhecimento.

Ele aproveita para enaltecer a unidade a qual esteve vinculada a sua vida acadêmica. “A Faculdade de Letras da Ufal se torna uma referência de Alagoas ao formar profissionais em área tão restrita”, enfatizou reconhecendo o mérito de um projeto pedagógico exitoso que resulta na positividade de um trabalho, mesmo com tantos desafios.

Acessibilidade e desafios

Dizendo-se feliz em fazer parte de um momento que transmite para a sociedade a importância da graduação em Letras-Libras, o egresso Ewerton Douglas Canuto de Albuquerque afirma ser gratificante ter um curso que valorize a comunidade surda, reforçando o determinante papel de inclusão social liderado pela Ufal. Segundo ele, foram muitos os desafios acadêmicos enfrentados, mas que proporcionaram avanço. “Nunca foi fácil ler artigos em português, entender as provas e compreender conteúdos complexos. Porém, se queremos aprender, conquistar nossos sonhos, é preciso esforço e dedicação para atingir nossos objetivos”, declara.

Nascido em Maceió, Ewerton tem 100% de perda auditiva, fez a formação fundamental e média na Escola Estadual Tavares Bastos, localizada na capital e reforça o quanto a graduação oportunizou conhecimento. “Quando ingressei na Ufal, no curso de Letras – Libras pude perceber que busquei muitos conhecimentos que, antes, no ensino fundamental e médio não adquiri por falta de acessibilidade que facilmente os ouvintes têm. Vejo que minha trajetória na graduação me proporcionou abrir a mente para diversas temáticas”, enfatiza.

Sobre isso, ele disse que a sua formação superior foi reforçada pela participação, com bolsas, em Programa de Monitoria da disciplina Fundamentos de Libras e o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (Pibic), com foco em Corpus de Libras. Por conta dessa participação Ewerton foi o primeiro monitor surdo da Universidade Federal de Alagoas .

Único da família a se graduar numa universidade pública, Ewerton disse que o processo da sua vida acadêmica começou a causar preocupação aos seus familiares pela grande demanda das atividades, provas, seminários e principalmente pelas madrugadas onde o estudo dava lugar ao descanso.  “Minha família estava acostumada com ensino superior privado no qual não exige tanta cobrança como a de uma instituição federal e era estranho para eles sentir tamanha responsabilidade por parte das demandas que a Ufal me proporcionava”, acrescenta.

No processo de conquista, aponta o empenho do corpo docente no desenvolvimento das produtivas atividades, como as disciplinas que fazem parte da grade. Ele também aponta algumas dificuldades encontradas, a exemplo do desenvolvimento de mais pesquisas, por ser o curso ainda novo. Mas, reconhece a importância do processo de aprendizado obtido como egresso da primeira turma de Letras-Libras.

Em novo ciclo de formação conectado com o mercado de trabalho e futuro profissional, Ewerton já está numa pós-graduação na área de Libras como L1 para surdos e participando de concursos públicos. Ele também  aproveita para comemorar a preocupação existente para a ampliação do mercado de trabalho.

“Vejo que atualmente temos a proposta politica que vem trazendo a ideia de colocar a disciplina de Libras nas escolas públicas com o intuito de visibilizar a Língua de Sinais. Isso é gratificante, pois pretendo ser professor em algumas destas escolas e ser um mediador no processo de aprendizagem dos alunos para proporcionar conhecimento da Libras como fundamental elemento para a comunicação. Na área da educação, penso em ensinar ouvintes e surdos porque vejo que entre esses dois aspectos é necessário uma formação que garanta conhecimentos complexos da Língua de Sinais”, afirma.

Sobre o curso

Com vestibular próprio, para ingresso no segundo semestre letivo da Ufal, a iniciar em setembro deste ano, o curso receberá mais trinta alunos, conforme o número de vagas ofertado. As inscrições para o processo seletivo, que contemplam ouvintes e não ouvintes, foram encerradas no dia 13 deste mês. Das 30 vagas, destina-se o mínimo de 50% para pessoas surdas e as demais para ampla concorrência.

Conforme disposto no Art. 2º do Decreto nº 22 de dezembro de 200.4.2.1, considera-se pessoa surda aquela que, por ter perda auditiva, compreende e interage com o mundo por meio de experiências visuais, manifestando sua cultura principalmente pelo uso da Língua Brasileira de Sinais. Considera-se deficiência auditiva a perda bilateral, parcial ou total, de 41 decibéis (dB) ou mais, aferida por audiograma nas frequências de 500 Hz.

A seleção dos novos alunos, dotada de prova objetiva e prova de redação, ambas de caráter eliminatório e classificatório, tem a responsabilidade da Pró-reitoria de Graduação (Prograd) e do Núcleo Executivo de Processos Seletivos (Copeve).

O Curso de Letras-Língua Brasileira de Sinais (Libras) tem como objetivo geral produzir e divulgar conhecimento específico das Libras nas áreas de língua, literatura e cultura. Faz parte de uma política bilíngue nacional de incentivo ao uso e difusão da Libras, bem como de melhoria da educação da pessoa surda.

Com quatro anos de duração, o curso funciona no turno matutino, tem um amplo campo de estudos e trabalho, e requer uma concentração científica, em nível de graduação e pós-graduação.

Conforme a descrição do curso em consonância com o projeto pedagógico, a implantação e o fomento do ensino de Libras na Universidade, por meio de graduação em Letras-Libras (licenciatura) e a sua estreita relação com a extensão e a pesquisa em âmbito acadêmico e o diálogo com a sociedade, contribuirão significativa e positivamente com a formação de professores nessa área.

Inclusão e demandas

O Projeto para criação do curso foi desenvolvido em consonância com a política inclusiva proposta pelo então Ministério da Educação e Cultura (MEC) e pelo Plano Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, “Viver sem Limite” (Decreto nº 7.612, de 17 de novembro de 2011).  

“Segundo o Plano Nacional, uma das metas a ser alcançada era a implementação de 27 cursos de Letras-Libras (Licenciatura) e, diante deste contexto, visando a oferta de cursos, a Faculdade de Letras da Ufal apresentou ao Consuni a proposta de implementação, cuja aprovação deu-se em 7 de outubro de 2013”, frisou o professor Radjalma Teixeira, que assumiu a coordenação do curso em março deste ano.

Sobre a formação da primeira turma, apta ao mercado de trabalho, Radjalma enfatiza que a Ufal está conectada com a inclusão social. “A proposta do MEC em oferecer uma Educação Bilingue para surdos, visa, dentre outras razões, a garantia do acesso aos conteúdos escolares na primeira língua naturalmente adquirida. Para que isso fosse possível, certas medidas foram e continuam sendo tomadas. A meta do Decreto 5.626 estabelece um período de dez anos, a partir da data de publicação, para o cumprimento dos pontos por ele pautados, mobilizando as instâncias governamentais na direção da implementação dos ajustes devidos”, destaca.

O coordenador acrescenta que, uma das prerrogativas de caráter efetivo e obrigatório é a inclusão da disciplina curricular obrigatória nos cursos de formação de professores para o exercício do magistério, em nível médio e superior, e nos cursos de Fonoaudiologia de instituições de ensino, públicas e privadas. “O referido decreto acrescenta ainda, que ela deve ser disposta como disciplina optativa para os demais cursos de Educação Superior e de Educação Profissional, expandindo a demanda que ainda carece de profissionais qualificados para atendê-la”, diz.

Segundo Radjalma, atualmente, na rede pública, alguns governos têm adicionado a Libras no conteúdo escolar da educação básica. “Na rede privada, em Alagoas, já é possível encontrar algumas escolas que optam pelo ensino da Libras no seu currículo escolar. A adição deste conteúdo já é autorizada e qualquer escola pode implementá-lo, com a condição de que haja profissional que atenda às demandas existentes. Sendo assim, a Universidade Federal de Alagoas tem exercido um importante papel social, no que diz respeito à capacitação de profissionais para atender tais demandas”, reforçou.