Trabalhadores rurais cultivam terreno da Ufal em lançamento do Cres
25/03/2019 09h42 - Atualizado em 25/03/2019 às 10h14
Cerca de 70 trabalhadores rurais ligados ao Movimento Sem Terra (MST) chegaram bem cedo ao Campus A. C. Simões, da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), na última sexta-feira (22). Por volta das 7h30 foi iniciado o cultivo de cinco hectares do terreno ao lado do Radar Meteorológico, com sementes de feijão, milho, batata doce e manivas de mandioca. O cultivo marcou o lançamento do Centro de Referência Socioambiental (Cres), que nessa primeira fase contou com a colaboração do MST.
A proposta do Centro é desenvolver atividades voltadas para aproximação das comunidades do entorno da Universidade e, também, criar mais um espaço de parceria com os movimentos sociais agrários. “Esse é um momento inédito, que possibilita essa construção da Universidade com uma referência social. Trouxemos o nosso saber popular do cultivo da terra, da preservação das sementes crioulas, do cultivo do alimento saudável, que tem muito a ver com o tema da soberania alimentar", declarou Débora Nunes, coordenadora estadual do MST.
Para Nunes, a contrapartida da Universidade é a produção de conhecimento. "A Universidade pode contribuir com o campo, desenvolvendo equipamentos de baixo custo que diminuam a penalização do trabalho, como a matraca, por exemplo, que é um instrumento simples, mas muito eficiente para abrir os buracos para as sementes. Além disso, esses agricultores que estão aqui cultivando a terra sonham em ter seus filhos formados. A universidade precisa abrir as portas para essa comunidade", ressaltou Débora.
As sementes plantadas no terreno são crioulas, passadas de geração em geração por agricultores. São livres de agrotóxicos e de alterações transgênicas. “Estas sementes estão há centenas de anos sob a guarda das famílias, são adaptadas às condições climáticas e ao solo da nossa região, de forma natural. Nós sabemos que elas vão germinar e alimentar as pessoas sem envenená-las. Nós a chamamos de sementes da resistência, porque elas representam a história do nosso povo”, destacou Albani Rocha, da Articulação do Semiárido Alagoano (ASA).
Os alimentos cultivados nesse primeiro plantio serão destinados ao Restaurante Universitário (RU). “O MST é um grande parceiro da Universidade, que está nos ajudando nesse impulso inicial ao Cres, mas queremos convidar também a comunidade do entorno para se aproximar, cultivar e gerar renda. A partir desse Centro de Referência, nesse terreno que estava ocioso, queremos atribuir um valor de humanização à Ufal. A longo prazo queremos criar cooperativas para manter essa relação permanente com os moradores da circunvizinhança”, explicou a pró-reitora de Extensão, Joelma Albuquerque.
Mais oportunidades
Sob a coordenação da Pró-reitoria de Extensão (Proex), o Centro de Referência Socioambiental (Cres) tem a finalidade de se constituir como espaço de referência para cursos de formação, capacitações, palestras, pequenas oficinas e eventos, proporcionando diálogo, conhecimento, aprendizado e interação na construção de saberes com foco numa população carente, que rodeia a Universidade.
Durante a inauguração do Cres, a reitora Valéria Correia destacou que o projeto de extensão será contemplado, em sua estrutura, com a instalação de uma cozinha experimental, ecopontos e um parque a ser usufruído pela comunidade do entorno. Os objetivos foram pensados para possibilitar a essa população ter uma fonte de renda e capacitação para diversos meios de subsistência.
A solenidade contou com representantes da gestão central, dos três segmentos universitários, do poder público, de movimentos sociais e pesquisadores. Intervenções culturais, como poesia, teatro e música pautaram o evento que integrou representantes de trabalhadores rurais. O violinista Joselho Rocha e o flautista Abel dos Anjos, da Orquestra Filârmônica da Ufal, abriram a solenidade com a conhecida canção Asa Branca, dando sequência ao repertório com músicas identificadas com a vida e o ambiente do homem do campo.
“A Ufal se pinta de povo e estou muito feliz nesse dia pelo fortalecimento da construção das alianças, iniciadas há três anos. Nessa aliança do campo com a cidade, onde temos muito a aprender, estamos semeando esperança e cultivando sonhos. A Universidade é de vocês e faço a vocês os meus agradecimentos”, frisou a reitora dirigindo-se aos trabalhadores rurais participantes do projeto. Eles foram representados, oficialmente na solenidade, por Renildo Gomes e Débora Nunes, ambos da coordenação do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) e de assentamentos da Reforma Agrária.
Ao destacar sobre o aprendizado obtido por ter participado da atividade do plantio de mudas, Valéria reforçou a importância da ação e agradeceu à Associação do Semiárido (ASA), pela doação das sementes crioulas ao projeto. A entidade foi representada na solenidade por Júlio Dias, que reforçou a parceria e a importância da iniciativa também para a agricultura familiar e reforma agrária. Valéria aproveitou para destacar: “Estamos numa rede de solidariedade muito importante e a agricultura familiar está inserida nesse processo, com a aquisição de alimentos dessa atividade para os cinco restaurantes universitários da Ufal”, disse.
Renildo Gomes e Débora Nunes ratificaram a união do campo e cidade retratada no projeto e teceram elogios à Universidade: “Nossa luta é para semear a semente da igualdade. É importante a Ufal abrir as portas para divulgar o nosso trabalho”, disse Renildo. “Viemos porque acreditamos nesse projeto, num projeto de outra sociedade”, enfatizou Débora. O representante do DCE, Tiago de Luca, disse que o projeto representa um dos passos para deixar a universidade mais popular.
A reitora Valéria Correia também destacou o projeto de implantação do Cres para a curricularização da extensão, anunciando na oportunidade, como reforço nesse processo, o Fórum Popular Universitário a se realizar de 17 a 19 de maio. O evento objetiva abranger áreas diversificadas do conhecimento e contará com participação dos movimentos sociais . Aproveitou para fazer agradecimentos às parcerias firmadas, à equipe responsável e de apoio para a concretização do projeto no âmbito da Ufal.
Bem social
Ao enaltecer a importância do projeto, a pró-reitora de extensão Joelma Albuquerque disse esperar que o Centro de Referência Sociambiental seja um ponto de encontro de pessoas que pensem outra perspectiva de universidade e de formação. “A vinda de vocês, trabalhadores, é uma mensagem de solidariedade e de esperança para nós. A parceria com o MST é importante para que construamos novas formas de conhecimento. Nessa iniciativa é fundamental ter o Cres de forma socialmente referenciada e de interação com a classe trabalhadora. A Ufal é um bem da sociedade”, enfatizou.
O vice-reitor, José Vieira, ao dizer que a Ufal necessita estar atualmente mais próxima do povo no desafiante processo em curso, salientou a contínua luta dos trabalhadores, em especial, a travada pelos camponeses em tempos históricos no país. “A gestão está de parabéns por resgatar e construir essa luta no dia a dia com unidade. A Ufal precisa mais vezes se pintar de povo, como foi no passado e em tempos atuais, mais ainda necessita. Que homens e mulheres construam uma vida melhor com igualdade”, frisou.
O engenheiro agrônomo Reinaldo Falcão, assessor da Secretaria de Estado da Agricultura, Pesca, Pecuária e Aquicultura, representando o titular da pasta, Ronaldo Lessa, parabenizou a criação do Cres. “O agricultor sabe como preservar a natureza e do bem que ela é. O Centro já nasce de forma extremamente positiva, ao ser inaugurado neste 22 de março, Dia Mundial da Água, uma data que merece muita reflexão. A secretaria está à disposição da Universidade para ações em parceria, como efetivação de convênios voltados às políticas públicas”, enfatizou. Na oportunidade, Falcão anunciou a doação à Ufal de 700 mudas de craibeiras, árvore símbolo de Alagoas.