Seminário apresentará resultado de expedição no Baixo São Francisco

Laboratórios da Ufal e da Empresa Brasileira de Agropecuária (Embrapa) realizam os estudos científicos de mais de 150 amostras de áreas diversificadas.
Por Diana Monteiro - jornalista
29/10/2018 09h05 - Atualizado em 30/10/2018 às 13h36
Expedição reuniu cerca de 30 pesquisadores (Fotos: Arquivo da equipe)

Expedição reuniu cerca de 30 pesquisadores (Fotos: Arquivo da equipe)

Dentro de noventa dias serão divulgados resultados da primeira expedição científica realizada na região do Baixo São Francisco que envolveu cerca de 40 pessoas entre pesquisadores, representantes de órgãos estaduais, nacionais e de instituições estrangeiras, além de pescadores e pessoal de apoio. A expedição proporcionará o maior levantamento de dados científicos até então realizado, que entre outros benefícios, servirão para o projeto de revitalização do Velho Chico.

Sobre o que mais chamou a atenção dos pesquisadores durante a expedição, transcorrida de 15 a 19 deste mês, o coordenador Emerson Soares destacou a degradação e assoreamento, os focos de poluição, possíveis novos conflitos que poderão agravar-se na região, diminuição do pescado, quantidade de espécies exóticas substituindo as nativas, sumiço de algumas espécies endêmicas da bacia que outrora estavam em abundância e agora escassas e a desinformação das pessoas que vivem próximas ao rio. O lixo, a captação de água das cidades com indícios de poluentes, também são visíveis na região do Baixo São Francisco.

“No contexto das alterações do rio São Francisco, constatamos a cunha salina que avança nas cidades, com índices vinte vezes maiores que o preconizado por resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente, o Conama. A exemplo de Piaçabuçu, tornando aquela água imprópria para consumo humano ou mesmo para atividades rotineiras”, frisou Emerson, que integra o corpo docente do Centro de Ciências Agrárias (Ceca) e coordena o Laboratório de Aquicultura (Laqua) da Ufal.

Sobre a sua área de pesquisa, a aquicultura e ecotoxicologia, ele adiantou: “Já se verifica problemas com processo reprodutivo das espécies reofílicas, que migram para se reproduzirem, diminuição das espécies nativas na composição das capturas, assim como presença de espécies carnívoras em grande quantidade, o que agrava o processo de competição, além da qualidade de água com indícios de poluição orgânica e química”, disse.

Liderada pela Universidade Federal de Alagoas, a expedição teve os municípios ribeirinhos de Penedo, Traipú, Porto Real do Colégio, Igreja Nova e Piaçabuçu, como alvos para as diversificadas pesquisas que na primeira etapa resultou em mais de 150 amostras para estudos   com foco em água, peixes, sedimentos e solo, além de entrevistas e aplicação de questionários nas citadas comunidades ribeirinhas. “ Possivelmente em dezembro estaremos com os estudos científicos em fase de finalização e pretendemos apresentá-los em um seminário, ainda sem data prevista, mas a se realizar em um dos municípios que fizeram parte do roteiro da expedição”, adiantou o professor Emerson Soares.

O pesquisador destaca que também foram observados problemas de conflitos entre pescadores e agricultores por novas ilhas que estão sendo formadas devido alterações no ciclo de vazão do rio. Ainda, diminuição do número de espécies nativas aquáticas, processo acelerado de assoreamento e degradação ambiental, solos mais pobres, qualidade de água com indícios de poluentes, a exemplo de metais pesados, agrotóxicos e esgotos domésticos (poluição orgânica). Segundo Emerson, em consequência do impacto ambiental existente, já é possível ser observado também o aumento considerável de espécies marinhas no rio. 

“O estudo aprofundado no Baixo São Francisco com objetivo de contemplar as várias áreas de pesquisa foi motivado pela ocorrência de muitas alterações no rio, entre elas, as provocadas pelas hidroelétricas, transposição, regime de chuvas alterado, desmatamento, crescimento das cidades ribeirinhas sem sistemas de tratamento de esgotos, pesca sem monitoramento e de forma inadequada quanto aos padrões preconizados na legislação ambiental. Assim como secas, crescimento da carcinicultura na foz, aumento do uso de agrotóxicos, entre outras atividades antrópicas (provocadas pelo homem), disse o coordenador.

Esperança para nova realidade

Durante o percurso para visitação e coletas Emerson enfatizou que a expedição científica despertou curiosidade nas comunidades ribeirinhas do Baixo São Francisco: “As pessoas agiam com certa curiosidade e se aproximavam como também se prontificavam em nos auxiliar  no que tinham conhecimento sentindo-se colaboradoras para mitigar os problemas do rio. Mesmo percebendo o quanto sofre o agricultor e o pescador daquela região pela realidade existente, vimos o quanto nutrem a esperança de dias melhores. Para eles, o barco da expedição representou mais um porta-voz de alerta aos governantes. É como se a voz deles pudesse ser ouvida por meio da equipe. Esta foi a impressão que a expedição teve durante todo roteiro”, disse.

Mas segundo Emerson, também foi percebida que ainda falta na população ribeirinha um melhor entendimento do significado do rio para a vida dela, mesmo reconhecendo a sua importância. “O Velho Chico tem um enorme potencial ambiental, social e econômico, é a alma da população ribeirinha. Está bastante degradado, sofrido, mas ainda resta um pouco tempo para agirmos. Precisamos de um programa de monitoramento e ações urgentes em nível regional. Morei oito anos na região, só agora entendi de verdade o que rio representa para nossas vidas. Ele é a grande força motriz que move todas as cidades deste imenso Nordeste”, reforçou Emerson que ingressou como docente da Ufal na Unidade de Ensino Penedo, pertencente ao Campus Arapiraca.

 Ansiedade, preocupação, lágrimas, emoção e amor por aquele rio, foram ditas por Emerson Soares como as descrições mais usadas por todos que participaram da troca de experiência em prol do São Francisco. “O pesquisador espanhol que estava na expedição ficou encantado e disse querer participar da próxima expedição, assim como o português, que se prontificou em colaborar programando-se para vir da próxima vez para trabalhar com microplásticos e microparasitas de peixes. Como era de se esperar, ficaram maravilhados com exuberância do rio, mas também estarrecidos como tratamos tão mal o Velho Chico”, afirmou. 

As amostras estão sendo processados nos laboratórios da Ufal e Embrapa. “Vamos conversar com o Comitê de do São Francisco e Fapeal para a possibilidade de publicação de um livro da expedição. Juntos com a Ufal realizaram ainda uma filmagem sobre a ação”, frisou.

 Positividade da Expedição

No barco de vinte e três metros de comprimento, dotado de três pavimentos com capacidade para 120 pessoas foram feitas mais de quatrocentas visitações. A expedição contou também com um barco robótico Iracema conseguido por meio da colaboração do Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer, que pertence ao Ministério de Ciência Tecnologia Inovações e Comunicações (MCTIC) e estreou nas águas do Velho Chico: “Foi a primeira participação do barco robótico em uma expedição desta envergadura e serviu para testar e resolver possíveis falhas, além de monitorar por meio do sidescan o relevo do rio e parâmetros limnológicos”, disse Emerson aproveitando para anunciar que há a possibilidades e tentarão buscar recursos para construir em Alagoas um barco semelhante ao Iracema que receberá o nome de “Chicão”.

A expedição, segundo Emerson, foi um sucesso, conseguiu reunir cerca de 30 pesquisadores e pessoal de apoio nos trabalhos e o apoio financeiro e articulação do Comitê de Bacias Hidrográficas do São Francisco (CBHSF), da Fundação de Amparo de Pesquisas de Alagoas (Fapeal) e da Ufal. No apoio, às atividades de campo contaram com a colaboração da Empresa Brasileira de Agropecuária (Embrapa), CTI-Ministério da Ciência e Tecnologia e Inovações e Comunicações (MCTIC), Emater e das prefeituras de Igreja Nova, Penedo e Piaçabuçu. . Para a próxima expedição científica além da Codevasf, Seap, prefeituras instituições privadas mostraram interesse em colaborar somando a luta para traçar dias melhores para o Velho Chico. “Surpreendeu-nos o apoio da população e das Secretarias de Agricultura e Meio Ambiente dos municípios de Traipú, Igreja Nova, Penedo e Piaçabuçu", disse o professor. 

Aproveitou para tecer agradecimento aos parceiros da ação científica: “O CBHSF foi o grande impulsionador desta expedição. Devemos muito ao presidente Anivaldo Miranda e ao professor Melchior Nascimento, colega da Ufal,  por acreditarem  que seria possível a expedição, tornando-a uma  realidade. O Comitê já assumiu compromisso para a próxima expedição. A Fapeal foi essencial no processo de articulação e de recursos também. Agradeço aos professores Fábio Guedes e João Vicente por acreditarem e pelo apoio, principalmente no âmbito da Ufal, importante parceira para concretização da ação e desenvolvimento das pesquisas”, afirmou Emerson.