Condicionadores de ar sem manutenção podem favorecer a incidência de graves doenças respiratórias

Má qualidade do ar contribui para a reprodução de fungos, vírus e bactérias


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Eurípedes Alves durante demonstração de medição da qualidade do ar | nothing
Eurípedes Alves durante demonstração de medição da qualidade do ar

Diana Monteiro - jornalista

A climatização é dotada para proporcionar conforto e bem-estar à maioria dos espaços físicos destinados a atividades profissionais e de circulação de pessoas. Imaginar, por exemplo, uma rotina de trabalho em meio ao insuportável calor é ter a certeza de que a produtividade e o desempenho ficarão comprometidos. 

Mas o tão sonhado ambiente climatizado, sem a manutenção adequada dos condicionadores de ar, pode se constituir numa porta de entrada para graves e até irreversíveis doenças respiratórias, já que oportuniza a ação de contaminantes biológicos, como fungos, bactérias e vírus; além de químicos, como o dióxido de carbono (C02) eliminado pelo próprio ser humano. 

Para se ter ideia do quanto é grave a falta de renovação de ar para a saúde humana, até os tidos inofensivos produtos de limpeza doméstica, substâncias químicas que são enquadradas como compostos orgânicos voláteis, podem se constituir também em contaminantes. Assim como máquina fotocopiadora, para quem a manuseia se instalada em ambiente com má qualidade de ar. 

A Universidade Federal de Alagoas (Ufal) tem desenvolvido, desde 2009, pesquisas com foco na qualidade do ar, sob a coordenação do professor Eurípedes Alves da Silva Filho, do Laboratório de Ambientes Climatizados e de Genética e Microbiologia Aplicada, instalado no Instituto de Ciências Biológicas e da Saúde (ICBS). O laboratório tem despertado interesse de alunos da graduação em Biologia e de pós-graduação (mestrado e doutorado) em Ciências da Saúde para importantes estudos conclusivos de formação voltados à área. 

Doutor em biologia molecular de fungos pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Eurípedes reforça que a má qualidade do ar provoca o acometimento de vários tipos de pneumonias e contribui para a incidência de conhecidas infecções relacionadas às vias respiratórias inferiores e superiores a exemplo, de rinites, sinusites, rinossinusites, amigdalites e faringites. Uma das graves infecções provocadas por fungos são asaspergiloses pulmonares invasivas que se instalam nos pulmões. Se não diagnosticadas e não tratadas em tempo, podem provocar tumores conhecidos como “bolas fúngicas”. E complementa: 

“Caso as aspergiloses pulmonares invasivas cheguem à corrente sanguínea podem desenvolver infecções semelhantes em outros órgãos, como no cérebro, por exemplo. Também afetam próteses coronárias ou ortopédicas, principalmente as espécies Aspergillus fumigatus e A. flavius, muito comuns em condicionadores de ar”, frisa Eurípedes. Outro preocupante contaminante destacado pelo pesquisador são as micotoxinas. “As pesquisas comprovam que aproximadamente 50% das micotoxinas atualmente conhecidas são carcinogênicas e podem provocar câncer em vários órgãos como pulmão, rim, cérebro e pâncreas”, enfatiza.

 

Recomendação 

O professor Eurípedes Alves destaca que todo sistema refrigerado seja por equipamentos central ou Split, que ocupa quase a totalidade dos ambientes climatizados, ou mesmo os de janela (mais antigos) necessita de manutenção e de dispositivos que promovam a renovação (troca de ar), porque a maioria dos aparelhos fabricados nos dias de hoje no Brasil não apresenta esta capacidade de dispositivos de renovação. O que gera o acúmulo de poluentes principalmente os biológicos. E recomenda: “Para garantir o ar de uma qualidade aceitável à saúde humana, pelo menos, a cada seis meses deve ser feita manutenção geral, e uma vez por semana limpeza de filtro”, diz. 

Acrescenta que os ambientes climatizados dotados de sistema central de refrigeração podem possibilitar melhor qualidade do ar porque a sua instalação já prevê a renovação do ar ambiente, desde que também se faça a manutenção dentro do que preconiza a legislação. 

O Laboratório de Ambientes Climatizados e de Genética e Microbiologia Aplicada da Ufal desenvolve estudos locais em shoppings centers, instituições de saúde, como hospitais, dentre outros. Atendendo solicitação da Pró-reitoria de Gestão de Pessoas (Progep), está em andamento pesquisa em todos os ambientes de trabalho do prédio da Reitoria, no Campus A. C. Simões, em Maceió. 

Para o estudo científico sobre a qualidade do ar o laboratório faz a separação e identificação dos contaminantes químicos e biológicos. Além de uma equipe de sete alunos de Biologia, participam da equipe a mestre em Ciências da Saúde Elaine Cristina Silva e o doutorando Gean Phillipe Marques do Nascimento com a pesquisa “Investigação de vírus em ambiente climatizado”.

 

Desconhecimento da Legislação 

A morte do então ministro Sérgio Motta em 1998 por infecção pulmonar provocada pela bactéria Legionella pneumofhila, que pode ser veiculada em sistema de ar refrigerado, motivou naquela ano a criação, pelo Ministério da Saúde (MS), da Portaria 3.523 para a boa qualidade do ar estabelecida no Plano de Manutenção Operação e Controle, o conhecido PMOC. 

De acordo com a legislação, todo ambiente climatizado de uso público coletivo e que tenha capacidade térmica em seu conjunto acima de 60 mil BTUs, precisa implantar o Plano, sob a responsabilidade de um engenheiro mecânico. Em janeiro de 2003 a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) criou a Resolução nº 9 que estabelece os parâmetros da qualidade de ar, os quais são regidos por quatro Normas Técnicas que definem osValores Máximos de Referência (VRM). 

No Brasil, Eurípedes aponta como dificuldades para cumprimento da legislação os seguintes fatores: “O desconhecimento por parte da sociedade quanto à existência da legislação em vigor e a falta de uma campanha de conscientização pelos órgãos competentes chamando a atenção para a problemática. É insipiente no Brasil, à exceção do Rio de Janeiro, onde há uma ação efetiva nessa área, porque o trabalho, que é descentralizado, depende de cada município”, reforçou. 

Na Europa os países que se sobressaem com a melhor legislação para a qualidade do ar são Portugal e Bélgica e segundo o pesquisador nenhum ambiente climatizado ou nenhuma construção será autorizada a funcionar se não atender à resolução determinada. 

 

As Normas da Anvisa 

NT01 para Bioaerossóis (até 750 ufc/m3 – unidades formadoras de colônias por metro cúbico de ar); NT02 para CO2 (até 1.000 ppm - partes por milhão); NT03 para Temperatura (23ºC a 26ºC), Umidade Relativa (40% a 65%), Velocidade do Ar (até 0,25 m/s - metros por segundo); e Aerodispersóides também conhecido como poeira total (até 80ug/m3 - oitenta microgramas por metros cúbicos de ar). “Cabem às Vigilâncias Sanitárias Municipais a cobrança de implantação da qualidade do ar de ambientes climatizados”, informou o professor.