Pesquisa analisa como criar bem os filhos em situações adversas

Estudo busca identificar características de mães que proporcionam bom desenvolvimento dos filhos mesmo que enfrentem pobreza e violência

11/12/2014 11h10 - Atualizado em 11/12/2014 às 17h11
Professor e pesquisador Cláudio Miranda analisa como criar bem os filhos em situações adversas

Professor e pesquisador Cláudio Miranda analisa como criar bem os filhos em situações adversas

Lenilda Luna - jornalista 

O professor Cláudio Torres de Miranda, psiquiatra e pesquisador da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Alagoas, foi pioneiro em identificar que a desnutrição de crianças pequenas não está relacionada apenas à condição financeira das famílias, mas também à situação emocional e psicológica das mães. Na década de 1990, ele e seus colaboradores publicaram um estudo que se tornou referência para várias outras pesquisas posteriores, não só no Brasil, como na África e Ásia, sobre como uma mãe depressiva e ansiosa tem mais dificuldades de colocar em prática as orientações dos médicos para o cuidado com as crianças. 

A pesquisa, iniciada em São Paulo, foi depois ampliada no entorno da Universidade Federal de Alagoas, com crianças assistidas pelo Centro de Recuperação em Nutrição (CREN), no conjunto Denisson Menezes, em Maceió. "Percebemos que, além de garantir recursos financeiros, é preciso que essas mães tenham algum suporte social, possam compartilhar o cuidado das crianças. Muitas vezes são mães sozinhas, que moram em bairros com altos índices de criminalidade e que se sentem amedrontadas, e isso causa muita angústia", relata o pesquisador.

Também foi realizada uma pesquisa mais abrangente, publicada em 2011, pela então mestranda Adriana Paffer, sob a orientação do professor Claudio Miranda, intitulada Fatores de risco para saúde mental materna e seu impacto sobre o estado nutricional infantil. O estudo realizado em 38 municípios sertanejos, aplicou o questionário Self Report Questionnaire (SQR-20), desenvolvido pela Organização Mundial da Saúde (OMS), com 288 mães, na faixa etária de 15 a 45 anos, que tinham filhos de até 2 anos de idade, consolidando a observação de que a pobreza é um fator de risco para o surgimento de doenças mentais nas mães. 

O psiquiatra ressalta que, muitas vezes, essas mães que não conseguem cumprir as tarefas rotineiras de cuidados com os filhos, são consideradas displicentes e irresponsáveis. "Mas, na verdade, essas mães estão doentes e precisam de ajuda, porque para elas, tarefas que para outras mães são simples, tornam-se bastante complicadas. Elas têm mais dificuldades de lidar com os horários de alimentação, remédios, higiene das crianças, e por isso, tendem a ter filhos desnutridos. É um quadro que elas não vão conseguir superar sem ajuda", explica Cláudio Miranda. 

Intervenção e estudo 

Em uma recente intervenção, a partir dos dados dos estudos realizados, os estudantes de mestrado, orientados pelo professor Cláudio Miranda, começaram a orientar as mães sobre alguns passos para o bom desenvolvimento das crianças utilizando método preconizado pela OMS. "Dicas simples, como contar histórias para os filhos, ouvir o que os pequenos têm para dizer, valorizar as conquistas e descobertas deles, levá-los para passear e observar o meio em que vivem. Mas então, algumas mães colocaram as dificuldades de andar com os filhos pelas ruas, onde não há segurança e impera o medo e a lei do silêncio", disse o pesquisador. 

A partir desses relatos, de dificuldades que nem sempre são levadas em conta no consultório de um pediatra, os pesquisadores orientados pelo professor Cláudio Miranda começaram a destacar os exemplos das mães que conseguem cuidar bem dos filhos, mesmo cuidando das crianças sozinhas, sem o apoio de um marido, e vivendo nas mesmas condições de dificuldades financeiras, medo, violência. "É isso o que estamos levantando agora. Queremos identificar as características dessas mulheres, que lidam melhor com essa situação adversa e saber quais as lições que elas podem ensinar", disse o professor. 

Com os resultados desse levantamento, os pesquisadores pretendem fazer uma intervenção mais qualificada levando em conta a saúde mental das mães. "Vamos continuar nesse estudo por mais um ano, mais ou menos, e com os dados levantados, vamos programar uma nova intervenção, relacionando o que chamamos de resiliência, ou seja, essa capacidade de lidar com problemas, superar obstáculos e se sair bem. Esse tipo de estudo está sendo feito não só no Brasil, mas em outros países que vivem situações de pobreza, guerras, violência, que precisam ser enfrentadas diariamente pelas mães, no cuidado com os filhos. O importante é conhecer essa realidade, para saber como intervir", pondera o Cláudio Miranda.