Pesquisa revela dificuldade para escolhas reprodutivas livres

Padrões tradicionais de gênero e a comunicação conflituosa entre profissionais e mulheres influenciam nas decisões sobre métodos contraceptivos

10/07/2013 16h20 - Atualizado em 14/08/2014 às 10h31
Ariana Cavalcante pesquisou usuárias do SUS

Ariana Cavalcante pesquisou usuárias do SUS

Manuella Soares - jornalista 

Uma pesquisa realizada pelo Instituto de Ciências Sociais da Ufal levantou o questionamento: Hoje em dia só engravida quem quiser? O estudo feito com usuárias do Sistema Único de Saúde em Maceió analisou mulheres que procuraram assistência relacionada à saúde reprodutiva em unidades de atenção básica, no município de Maceió. As práticas contraceptivas foram assunto de destaque entre as participantes, sendo a pílula anticoncepcional o método mais utilizado.

São muitas as críticas e desconfianças que as mulheres relatam quanto ao uso de pílulas. “Essas insatisfações reúnem desde os incômodos advindos dos sintomas colaterais até a consideração de que este método, na realidade, traz benefícios que são pequenos diante dos efeitos prejudiciais que, inclusive, podem vir a causar maiores complicações de saúde. Ainda assim, as participantes afirmaram que não podem deixar de lado o uso da pílula anticoncepcional para evitar colocar tanto filho no mundo", comentou a pesquisadora Ariana Cavalcante de Melo.  

A pesquisa, que resultou na dissertação do mestrado em Sociologia pela Ufal de Ariana Cavalcante, mostra a dificuldade de diálogo entre as usuárias e os profissionais de saúde para, por exemplo, escolher um método contraceptivo. “Muitas mulheres esforçam-se para compreender o discurso dos profissionais, mas a linguagem utilizada se distancia dos valores e crenças que as usuárias já possuem sobre suas vidas reprodutivas", destacou Ariana.

Outro aspecto presente no discurso das mulheres em relação à reprodução é a ideia que condiciona o planejamento reprodutivo às limitações financeiras. Ou seja, as mulheres entendem como uma prática 'controlista' que relaciona natalidade à pobreza. “A predominância desse discurso deixa de lado a autonomia e o comprometimento com os projetos de vida dessas mulheres”, ressaltou a autora da pesquisa, evidenciando que as participantes já haviam interiorizado a ideia de não ter muitos filhos quando não tem condições financeiras de criar.

Valores Tradicionais influenciam nas escolhas

O trabalho que iniciou nas unidades de saúde e se aprofundou no cotidiano das mulheres pesquisadas, revelou a influência de modelos patriarcais de gênero nas decisões da vida reprodutiva dos casais. “Ainda é muito forte o peso da gravidez atribuído às mulheres, como se os homens fossem menos responsáveis pela reprodução”, disse a pesquisadora Ariana Cavalcante.

“As dificuldades em relação à escolha reprodutiva envolvem diversas questões. Por exemplo, mulheres casadas relataram que há machismo na recusa de seus parceiros em relação ao uso de preservativos masculinos. A pouca procura pela vasectomia também expressa que, neste campo, há relações desiguais entre os gêneros”, concluiu.  

A opção da laqueadura

A pesquisa entrevistou mulheres durante seis meses para compreender as escolhas dos métodos contraceptivos e constatou que muitas escolhiam ser submetidas à laqueadura tubária sem ter uma noção exata do que é o procedimento. "A predileção que algumas mulheres possuem pela laqueadura, muitas vezes é porque acreditam que através deste método elas conseguirão prescindir das tantas filas de espera para a marcação de consultas, da falta de profissionais para atualizar receituário, dentre outros impasses”, comentou a pesquisadora, destacando a importância de ações que estejam comprometidas com a promoção da autonomia das mulheres, garantindo espaços para o diálogo e para as escolhas.