Ufal em defesa da vida, texto publicado no Blog do Ricardo Mota

O texto abaixo é de autoria da socióloga e professora da Ufal, Ruth Vasconcelos. Estudiosa de tema tão atual, a violência, ela assumiu uma importante iniciativa junto aos estudantes universitários: participar da construção de uma nova cultura - de paz ativa. Não é uma tarefa nada fácil, mas é, essencialmente, necessária. Aqui estão algumas reflexões sobre as causas da violência. Mais importante, porém, o texto traz uma bela provocação a cada um de nós. (Ricardo Mota)

23/03/2009 11h07 - Atualizado em 13/08/2014 às 00h35

Texto de Ruth Vasconcelos publicado no Blog do Ricardo Mota -- www.tudonahora.com.br

A violência no Estado de Alagoas tem raízes históricas; mas, somado a isto, deparamo-nos com uma conjuntura desestruturada e desestruturante que tem favorecido a explosão de uma violência social e interpessoal que vem afetando gravemente a possibilidade da constituição de laços e vínculos sociais mais duradouros no seio da sociedade. Não por acaso, a desconfiança, o medo e a insegurança tornaram-se sentimentos hegemônicos entre os sujeitos de todas as classes sociais. Na verdade, esses sentimentos respondem a uma combinação de fatores que expressam o desrespeito e o não-reconhecimento do outro como sujeito de direitos. Nem mesmo há o reconhecimento do mais básico e elementar de todos os direitos: o direito à vida, o direito de existir.

Todos sabem, inclusive os gestores do Estado, que a maioria da população alagoana vive abaixo da linha da pobreza; assim como sabem que a maioria não tem acesso à saúde digna, à educação de qualidade, a moradias minimamente estruturadas, nem muito menos são contempladas em programas culturais e de lazer fundamentais para a satisfação e realização no campo subjetivo. Não tenho notícias da existência de teatros, cinemas, praças públicas urbanizadas, campos de futebol adequados e parques de diversão para atrair a população da periferia em práticas culturais saudáveis. Ao contrário, cada vez mais cedo os jovens estão sendo atraídos pelo consumo da bebida, e de outras drogas mais pesadas, que os destroem, porque, quase invariavelmente, os viciam e os desestruturam subjetivamente. Apesar de não existir uma relação necessária entre drogas e violência, sabe-se do jogo bruto que envolve o tráfico de drogas, que geralmente vem acompanhado do tráfico de armas, dizem os especialistas. Esta é uma realidade que tem atingido os jovens de todas as classes sociais, o que desmistifica a idéia de que a pobreza é a responsável pela violência. Ao contrário, crescem as notícias de jovens pertencentes às classes dominantes que estão envolvidos na criminalidade.

Os bairros de periferia são, evidentemente, as principais vítimas da violência estrutural, marcada pela insuficiência de políticas estatais e pela amplificação do desemprego. Aliás, a periferia conhece muito bem o Estado, particularmente quando são "visitados" pela sua força policial; infelizmente conhecem muito pouco o Estado em sua função de assistência social, basta ver que muitos sequer têm registro de nascimento ou outro documento que lhes permitiriam entrar no rol dos cidadãos alagoanos. Os dados evidenciam que é na periferia onde são registrados os maiores índices de homicídios, com o detalhe de que os jovens são as principais vítimas e algozes desta realidade. A periferia tem sido o cenário de maiores ocorrências de homicídios, mas ninguém está a salvo de ser vítima da violência nos espaços públicos e privados. Vivemos um esgarçamento nos laços sociais que torna a imprevisibilidade da vida ainda mais intensa. Sem querer produzir um discurso sensacionalista ou alarmista, não temos qualquer segurança de que sairemos de casa e retornaremos com vida. Este sentimento de insegurança foi captado por um Núcleo de Pesquisa de Minas Gerais quando constatou que 70% dos brasileiros acreditam que perderão suas vidas, como vítimas de violência, nos próximos dois anos.

Pois bem, esta realidade é cruel; e a Ufal, através da Proest, está se propondo a discutir essa problemática junto à comunidade universitária através de um Programa Permanente denominado Ufal em Defesa da Vida. Nosso objetivo é criar um espaço onde possamos construir uma nova cultura política que esteja sintonizada com a vida e não com a morte. O envolvimento de jovens, estudantes universitários nesta discussão, através de atividades culturais, políticas e científicas, torna-se fundamental porque esses jovens serão os futuros gestores do nosso Estado; os futuros profissionais, jornalistas, médicos, engenheiros, sociólogos, psicólogos etc, que atuarão no tecido social, tomando decisões que tanto podem aprofundar esta realidade como transformá-la. O envolvimento de todos é importante também porque a Universidade aglutina hoje em torno de 20 mil pessoas, entre professores, estudantes e funcionários que têm, por dever de ofício, um compromisso com a sociedade. É esta sociedade que nos financia e é a ela que devemos dar respostas através dos nossos estudos, pesquisas e ações políticas conseqüentes.

Como ato inaugural do Programa Ufal em Defesa da Vida, estamos realizando no dia 02 de abril, às 11hs, um ATO PÚBLICO na Avenida Central da Ufal, onde construiremos um grande varal com 2.064 camisas/blusas simbolizando as 2.064 vidas perdidas, vítimas de violência, no Estado de Alagoas, no ano de 2008.

A universidade tem uma responsabilidade social; e, nesta hora de tamanha gravidade não pode ficar silenciosa. A Proest pretende estimular a produção de políticas estudantis e acadêmicas que favoreçam a construção de uma nova cultura política pautada em valores que defendam a vida e os direitos sociais. É preciso que todos(as) compreendem, de uma vez por todas que, se não há segurança para todos(as), não há segurança para ninguém.

Para ajudar a realização do nosso Ato estamos solicitando a doação de uma camisa/blusa (usada) para a construção do referido varal.

Definimos como pontos de arrecadação das camisas/blusas os seguintes espaços: Proest, Restaurante Universitário, Biblioteca Central, Espaço Cultural (Setor de Artes), Icbs, Ceca e Hospital Universitário.

Desejamos que este Ato inaugural conte com a efetiva participação de todos(as) os(as) estudantes, professores(as) e funcionários da Ufal. Mas também contamos com a decisiva participação da sociedade civil e dos(as) jornalistas do nosso Estado para divulgar e estimular o envolvimento da juventude não só na participação deste ATO do dia 02 de abril, mas também nas atividades que o Programa Ufal em Defesa da Vida desenvolverá durante todo o ano de 2009.