De aluna a vice-coordenadora do Paespe, Geiza Gomes conta como a Ufal mudou sua vida

Ela viu a possibilidade de ingressar na Universidade ao participar do programa de extensão
Por Thamara Gonzaga - jornalista
12/01/2021 15h12

São muitas as histórias que marcam os 60 anos de existência da Universidade Federal de Alagoas. Além da qualidade do ensino, da pesquisa e do relevante papel social das ações de extensão, a Ufal tem sua importância sustentada por milhares de vidas que foram transformadas pelas oportunidades de crescimento proporcionadas pela instituição por meio da educação.

A de Geiza Correia Gomes é uma delas. Primeira da família a cursar o ensino superior em uma instituição federal, ela ingressou na Ufal em 2004, como aluna de extensão do Programa de Apoio aos Estudantes das Escolas Públicas do Estado (Paespe), iniciativa social iniciada em 1993 pelo professor Roberaldo Souza, do Centro de Tecnologia (Ctec), com o objetivo de ajudar jovens a ingressar em um curso superior.

Aluna de escola pública, ela conta que foi uma visita do professor Roberaldo à unidade de ensino em que estudava que a motivou a ingressar no Programa. “Ele conversou com os alunos, levou livros paradidáticos falando sobre o poder da leitura. Foi a primeira vez que li algo que não fosse das disciplinas da escola. Fiquei encantada com o primeiro exemplar que ele me entregou em mãos, era o livro Viagem ao Centro da Terra, do Júlio Verne”, recordou.

E foi durante as aulas do Paespe que estudar na Ufal passou a ser um sonho a ser alcançado. “Antes, eu desconhecia a Universidade e o seu papel transformador. Inclusive, de 2002 a 2004, trabalhei no ponto de xerox que era gerenciado pelo meu tio lá no curso de Arquitetura, mas eu não sabia ao certo o que a sigla Ufal significava, muito menos que eu poderia fazer parte da comunidade acadêmica. Minha visão de mundo mudou a partir do Paespe: sonhei alto, planejei a minha profissão e o caminho a trilhar para alcançar o objetivo”, afirmou.

Essa mudança de perspectiva de vida também alcançou mais pessoas da família. As três irmãs de Geiza participaram do Paespe e ingressaram nos cursos de química, pedagogia e ciências sociais da Ufal. Primos e primas também seguiram o caminho. “Acredito que seja fruto de um dos muitos ensinamentos do Programa que é atuar como multiplicador”, disse.

Atuação no Paespe

Atualmente, após concluir a graduação em engenharia civil e o mestrado em Recursos Hídricos e Saneamento, ambos na Ufal, ela atua como professora voluntária e vice–coordenadora do Paespe, além de cursar o doutorado em Recursos Hídricos na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

Geiza é só orgulho e gratidão ao falar sobre o Programa que ajuda a coordenar. “Antes do Paespe, não tinha perspectiva de ingressar no ensino superior, inclusive, desconhecia a possibilidade. O meu planejamento era concluir o ensino médio -o que era muito comparado ao grau de escolaridade dos meus pais, tios e demais familiares- e ingressar no mercado de trabalho para contribuir com a renda familiar”, relatou.

Ela destaca que participar da ação de extensão trouxe oportunidade de transformação para a família e ascensão socioeconômica. “Possibilitou que eu pudesse motivar outras pessoas da minha família a ingressar no ensino superior. Minha mãe, inclusive, retomou o ensino médio, se preparou para o Enem participando do Conexões de Saberes [outra ação de extensão da Ufal] e hoje faz graduação”, contou orgulhosa.

Sobre a oportunidade de trabalhar com jovens que, assim como ela, precisam lidar com as dificuldades de acesso ao ensino superior, Geiza argumenta que continuar no Paespe traz a riqueza de ver alunos ingressando na Ufal e em outras instituições, obtendo o diploma do ensino superior e rompendo com o ciclo da pobreza. “O programa gera mobilidade social, olha para comunidade externa e a convida a fazer parte desse mundo”, ressalta.

Além de vibrar com a conquista de cada estudante, para Geiza, coordenar o Paespe é oportunidade de aprendizado. “Aprendo com outras pessoas, aprimoro a minha sensibilidade humana e coloco em prática a empatia. Sensações e experiências que não conquistamos através de cursos, e sim por meio da preocupação social e entendimento do papel que cada um de nós deveria ter com a comunidade que vive às margens da sociedade”, defende. E completa: “Acredito que a maior bagagem que o Paespe me trouxe foi o desejo de retribuir aquilo que recebi e tornar o Programa tão grandioso quanto o coração do seu idealizador”.

Anos de graduação

São muitas as conquistas de Geiza alcançadas por meio das oportunidades encontradas na Ufal. No entanto, ela lembra que a jornada não foi fácil diante de muitos desafios a serem superados. “As recordações do início da graduação não são tão saudosas. Embora eu tenha sido aprovada no vestibular, a base escolar era insuficiente, as dificuldades eram imensas nas disciplinas de cálculo”, lembrou.

Uma das muitas barreiras era a defasagem no acesso a novas tecnologias. “Meu primeiro contato com um computador foi aos 17 anos, ao participar de um curso básico de informática no Paespe. Lembro que meu professor da disciplina de introdução à computação dava aulas considerando que a turma estava nivelada, que todos detinham o conhecimento para o uso do computador. Como eu conseguiria programar se eu sabia o mínimo do uso da máquina e não tinha nem o inglês básico para executar os comandos?”, indagou.

Durante esse período, o apoio de docentes e colegas de curso foi fundamental. “Além do meu mentor, professor Roberaldo, também tive o suporte de outras pessoas do curso e, principalmente, do grupo PET de Engenharia Civil, o que tornou a graduação mais leve”, afirmou.

Ela conta que não figurava entre os melhores alunos da turma, mas que sempre buscava participar ativamente. “Isso foi outro ensinamento do Paespe”, ressaltou. E esse interesse em participar de tudo que a Universidade proporciona a levou também a fazer parte de grupos de pesquisa. “Ainda durante o Programa, o professor Roberaldo colocou em prática a iniciação científica para o ensino médio. Eu e alguns colegas fomos apresentados à fascinante mecânica dos fluidos, realizando campanhas de campo em rios. Com certeza, a minha escolha de curso se deve a essa experiência única que naquela época raramente era proporcionada a quem ainda estava no ensino médio”, recordou, ao contar que, logo no início da graduação em engenharia civil, já foi contemplada com uma bolsa de pesquisa.

Ainda durante o curso, as adversidades se tornaram motivação e lição de vida para atuar de forma mais empática na profissão que escolheu seguir. “Hoje, como professora, pela minha origem e pelas experiências com os alunos em vulnerabilidade socioeconômica, entendo o meu papel na sala de aula e sei que não posso simplesmente dar o conteúdo programático de uma disciplina sem ter um olhar sensível para os estudantes. Afinal, não estamos em aula apenas para cumprir carga horária, temos que exercer o poder transformador da educação. Felizmente, tive professores que colocaram isso em prática e que me motivaram a continuar”, refletiu.

Ufal: local de oportunidades

“A Ufal mudou a minha vida e a da minha família”. Essa é a certeza defendida por Geiza Gomes ao lembrar de sua trajetória. Ela acredita que a educação é um instrumento transformador na vida de indivíduos, da sociedade como um todo, e defende o ensino público. “Tive a oportunidade de cursar graduação e pós-graduação gratuita, conhecer outros pesquisadores e trocar experiências com colegas. Vivi a Universidade, participando da tríade ensino, pesquisa e extensão”, relatou, ao citar também a importância da assistência estudantil como “fundamental para a conclusão do curso”.

Aprimoramentos de habilidades, como responsabilidade, disciplina e capacidade de resolução de problemas também são outros aspectos citados por Geiza como conquistas obtidas no ambiente acadêmico da Ufal.

Ainda de acordo com ela, também foi importante a experiência de conviver com diferentes classes sociais, econômicas e culturais. “Lamento bastante por ver que alguns estudantes não desfrutam dessa experiência única, assistem as suas aulas e voltam para casa, alguns por opção e outros por não conseguirem estar no campus fora do período de aula”, disse.

Ao falar sobre o aniversário de 60 anos da Ufal e a importância da instituição para Alagoas e alagoanos, Geiza afirma que a Universidade tem sido a porta de diálogo com a sociedade, através do respeito a diferentes formas de saberes. “Nossa Universidade tem cumprido o seu papel de socializar o conhecimento e disponibilizar seus serviços, exercendo a sua missão: o compromisso com a melhoria da qualidade de vida dos alagoanos, superando as desigualdades e exclusão existentes. Parabéns a todos que fazem a nossa Ufal”, concluiu.